quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Os dominós estão caindo...

Como que reproduzindo a seqüência de acontecimentos em momentos de crise bancária, a contaminação dos problemas dos bancos de investimento para o setor comercial e de seguros era questão de tempo. Uma das primeiras vítimas foi o Northern Rock Bank da Inglaterra, nacionalizado no início desse ano. Desde então, seguradoras nos EUA, Alemanha e Inglaterra, bancos de hipoteca e demais instituições do sistema financeiro em vários países, acompanharam essa onda negativa que gerou liquidação, nacionalização e fusões. O cenário é tão incerto que até boatos ajudam a derrubar o mercado, como foi o caso, na semana passada, do Bank of East Asia em Hong Kong, que teve filas de correntistas esperando sacar recursos após boatos de que a instituição estava sofrendo perdas. Já é possível identificar, em diversos sites no mundo, dicas para correntistas sobre como se protegerem em meio a essa crise, orientando os mesmos a dividirem os recursos entre diferentes bancos para resguardar os valores que o governo garante por lei para o poupador em caso de falência de um banco.

Quatro outros eventos recentes movimentaram o mercado; o banco com maior participação do mercado de hipotecas na Inglaterra, o HBOS, foi vendido para o Lloyds por ₤12 bilhões, o Breadford & Bingley, conhecido como B&B, também com atuação na Inglaterra, teve sua parte de gestão de hipoteca  nacionalizada enquanto o Banco Santander ficou com o controle das agências e a administração da poupança dos correntistas. O B&B possuía ativos totais de £50 bilhões, dos quais, ₤41 bilhões eram em hipotecas residenciais e investimentos de correntistas no total de £20 bilhões.
Nos EUA, o Washington Mutual, conhecido como WuMU  (sediado em Seattle), era um dos maiores bancos do País com 119 anos de atuação, tinha ativos da ordem de US$ 307 bilhões e representa a maior falência bancária da história dos EUA. Foi vendido para o JPMorgan por cerca de US$ 2 bilhões. Por fim, tivemos a compra do Wachovia, o quarto maior banco do País, pelo Citigroup por cerca de US$ 2,2 bilhões. Vale lembrar que o JPMorgan já havia comprado o Bear Stearns no início desse ano. O Wachovia tinha cerca de US$ 400 bilhões em depósitos de correntistas. Na Europa, o Banco Central Europeu teve que intervir e negociar a nacionalização do gigante dos negócios bancários e de seguros, o Fortis, com custo estimado da ordem de €11,2 bilhões. Para se ter uma idéia do impacto da liquidação dessa instituição, que emprega mais de 85 mil pessoas, basta ver sua presença na Bélgica, onde o Banco chega a ser o maior empregador privado, e possuindo contas de mais de 1,5 milhão de famílias, dominando metade do sistema bancário do País.
Esses são apenas alguns exemplos de como o sistema financeiro internacional está se reestruturando nesse momento. Com as movimentações ocorridas nos EUA, o mercado bancário ficou mais concentrado, com a maioria dos depósitos dos correntistas na mão de apenas três bancos, o Bank of América, o JPMorgan Chase e o Citigroup. Já se fala, inclusive, na possibilidade de, passada essa crise, reduzir o poder dessas três instituições que teriam enorme poder em fixar as taxas de juros para empréstimos. Na Inglaterra, a venda do HBOS para o Lloyds criou um gigante financeiro que detém cerca de 1/3 de todos os depósitos em poupança e do mercado de hipotecas do País. Se de um lado essa concentração pode representar um problema do ponto de vista de formação de taxas de juros para o mercado, devido a baixa concorrência, por outro, pode ajudar a solucionar mais rapidamente a crise, facilitando a ação dos Bancos Centrais, pois serão poucas as instituições restantes.
Dois acontecimentos dificultam uma solução mais rápida da crise. Em primeiro lugar, o fato de ser ano eleitoral nos EUA e, em segundo lugar, a própria crise de confiança. Nesse momento, o crédito sub-prime deixa de ser o vilão da crise, cedendo lugar para a confiança sistêmica. As instituições financeiras não estão confiando em seus pares, contribuindo para paralizar o mercado interbancário e aumentando ainda mais os riscos de falência. Um ponto importante serve de incentivo para a solução da crise de confiança, é o fato de que o calendário se aproxima do final do ano, onde a demanda por moeda é maior devido as festividades. A se manter essa crise de confiança no sistema financeiro, não só mais instituições devem enfrentar problemas como será natural o impacto sobre as demais atividades econômicas, em especial no comércio.
Há um importante dilema em todo esse cenário. Deixar que os bancos decretem falência pode ser visto como uma forma de punição do sistema. Porém, não resolve o problema da crise, podendo, inclusive, piorar a mesma. Por outro lado, promover o socorro a instituições financeiras, depois de ter ficado claro que as mesmas se aproveitaram da regulação frouxa para se alavancarem, pode passar a mensagem para o contribuinte e, em especial nesse ano, para o eleitor americano, que existe favorecimento. Portanto, a solução dessa crise passa, de forma particularmente importante, pela maior transparência e discussões das para dirimir essas dúvidas e facilitar a solução da mesma. Vale lembrar, o Brasil faz parte desse tabuleiro, e os dominós estão caindo.

Publicado no Informe Econômico de 29/09/2008

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