domingo, 10 de agosto de 2014

Não é apenas o preço do petróleo

Muitas vezes o debate no Brasil acerca do
aumento do preço do petróleo, e seus impactos sobre a
economia, ficam restritos a avaliações sobre a
possibilidade ou não de termos maiores preços de
derivados como a gasolina. A preocupação tem sua
justificativa, uma vez que essa possui o poder de
incendiar a inflação ao consumidor. Considerada de
forma isolada, a gasolina tem o segundo maior peso
na composição do IPCA, 3,95%. Ou seja, se a mesma
aumentar 10% e assim permanecer, seu impacto direto
sobre a inflação agregada será de 0,395 pontos
percentuais, isso sem considerar seus efeitos indiretos
na cadeia produtiva.

Porém, há outros impactos pouco discutidos e
que podem se espalhar de forma muito mais
disseminada sobre a economia. Em primeiro lugar,
existe uma estreita relação, observada no cenário
internacional, entre o preço do petróleo, gás e carvão.
Quando um aumenta de preço, os demais seguem esse
movimento, encarecendo o custo da energia para
consumidores e empresas. É o que chamamos de
correlação. Mas, é importante ressaltar, a forma de
repasse de preços irá depender da política praticada
em cada país. Naturalmente estão envolvidos custos
nesse processo de ajuste e, quem paga a conta é a
sociedade. De qualquer forma, se o cenário de preços
mais altos se mantiver, podemos esperar que a
atividade produtiva ficará mais cara, principalmente
em países que são importadores líquidos desses
produtos, como é o caso da China e de vários países
Europeus e também naqueles onde a política de preços
internos é repassar todo e qualquer aumento em dólar
no preço do petróleo.
A seguir, podemos avaliar os demais
derivados da cadeia de petroquímicos e que envolvem
não apenas a gasolina, mas também o óleo diesel, o
querosene e, um dos mais importantes para a
formação de preço das matérias-primas industriais, a
nafta. Ao misturar essa com gás condensado, é
possível encontrar uma série de produtos derivados,
como o eteno, o butadieno, o propeno e muitos outros.
Para se ter uma idéia de como é complicado
determinar os impactos indiretos de aumento de preço
desses derivados, basta ver que toda a indústria de
transformação utiliza, em maior ou menor grau, algum
tipo de derivado petroquímico.
No caso da indústria, os exemplos são vários.
Para a produção de calçados, podemos esperar
impactos no preço da sola de sapato. Na indústria de
plásticos, os impactos são diretos, aumentando o custo
de produção das embalagens plásticas, importante
insumo a ser utilizado pelas indústrias de alimentos,
de bebidas, como as garrafas PET e também na
produção de utensílios domésticos e brinquedos.
A indústria de borracha também é impactada
diretamente e essa, por sua vez, representa outro elo da
cadeia de produção de diversas outras indústrias, como
a automobilística na produção de peças e acessórios e
pneus. Tubos, conexões e mangueiras são outros
produtos que sofrem impactos, bem como componentes
eletrônicos, tintas, adesivos, fibras têxteis, algodão e
outros itens que também são utilizados pela construção
civil. Ou seja, a lista de produtos que estão direta ou
indiretamente ligados ao preço do petróleo é extensa.
A mensuração de impactos nessa cadeia irá
depender do jogo de força de alguns fatores. Em
primeiro lugar, quanto tempo e em que magnitude o
preço de derivados como o propeno, reage a mudanças
no preço do petróleo. Dados internacionais indicam
uma correlação de 96% entre o preço do petróleo e o
preço do propeno, tanto para cima quanto para baixo.
Em segundo lugar, é importante avaliar o peso desses
derivados em cada segmento industrial, o que pode
variar sobremaneira. No caso da indústria de plástico,
não há como evitar uma relação direta, uma vez que
esses petroquímicos básicos são fundamentais no
processo de produção.
Sendo assim, esse pode ser considerado como um
segmento sensível a oscilações no preço do petróleo.
Em terceiro lugar, a magnitude e o tempo que esses
maiores custos possam representar preço maior do
produto final irá depender da estrutura de mercado que
cada empresa está inserida. No caso de monopólio, os
reajustes de preços podem ser maiores do que para o
caso de um mercado em concorrência, seja essa perfeita
ou imperfeita. No meio termo, teríamos o oligopólio.
Por fim, há o varejo e sua capacidade de absorver esses
custos maiores.
Note que apesar de termos uma disseminação do
uso do petróleo em praticamente todos os produtos que
fazem parte do nosso dia-a-dia, a avaliação da
magnitude e do tempo em que esses repasses podem
ocorrer é muito complexa, envolvendo muitos fatores
internos e externos. Um ponto é certo: no início da
cadeia, os impactos são maiores do que aquele
verificado na gôndola do supermercado. Por um motivo
óbvio, os custos de produção vão se diluindo ao longo
de todo o processo.
Um preço do petróleo maior, conjugado com
tensões políticas em regiões estratégicas na produção,
baixos estoques, aumento da demanda maior que a
oferta são elementos de combustão para maiores custos
industriais em várias partes do mundo. A depender da
estrutura de mercado em cada país, essas modificações
de custos podem resultar em importantes perdas de
competitividade em segmentos industriais com
conseqüências sobre emprego e geração de renda.

Publicado no Informe Econômico 21/março/2011

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