domingo, 10 de agosto de 2014

Desequilíbrio à vista

Não há dúvidas sobre a importância em se
analisar o mercado de petróleo no mundo, que
representa cerca de 10% de todas as exportações
realizadas, US$ 1,8 trilhão por ano, e é responsável
por 33% do total de energia primária utilizada.
Sendo assim, mudanças de preços e quantidade terão
não só apenas impactos sobre o custo de transporte,
mas também, na inflação, crescimento econômico,
transações correntes, fluxo de capitais, taxas de juros
e na formação de riqueza.

O último relatório do FMI sobre as perspectivas
de crescimento mundial aborda, em capítulo
específico, o mercado do petróleo. Em primeiro
lugar, parece claro que a tendência de crescimento
do consumo é muito mais pronunciada do que a
capacidade de aumentar a oferta. Esse desequilíbrio
conjuntural, citado como a “escassez de petróleo”,
na verdade, tem componentes estruturais
importantes. Com preços maiores, há uma
transferência de riqueza dos países que são
importadores líquidos para aqueles que são
exportadores. Essa concentração de riqueza acaba
por resultar em maiores fluxos de capitais que, por
sua vez, contribuem para distorcer taxas de câmbio,
juros e preços, prejudicando os fundamentos das
economias. Outro efeito desse cenário seria a piora
na distribuição de renda, com conseqüente aumento
da pobreza, em especial nos países importadores de
petróleo.
Nos cenários avaliados, são apontados
problemas tanto do lado da demanda quanto da
oferta. No primeiro caso, a China pode ser citada
como o principal agente que tem contribuído para
gerar desequilíbrio devido a sua dimensão – já é o
maior consumidor de energia no mundo. É
importante destacar que o grupo dos mercados
emergentes possui a característica de ser intensivo
no consumo de energia. Isso significa que, para cada
ponto percentual de aumento na sua renda per capita
há um aumento de 0,7 p.p no consumo de petróleo.
Como esses crescem mais rapidamente que os países
desenvolvidos, é natural esperar que a demanda
continue pressionando os preços nos próximos anos.
Somente para a China, a estimativa é que o consumo
seja duplicado até 2017, relativamente aos dados de
2008.
Existe ainda um problema adicional: a
elasticidade preço-demanda do petróleo no curto
prazo é baixa. Ou seja, mudanças no preço têm um
impacto pequeno sobre a demanda do produto.
Estimativas apontam que um aumento de preço de
10% teria o poder de reduzir a demanda em apenas
0,2% no curto prazo, tanto para países membros
como os não-membros da OCDE. E mesmo no longo
prazo, onde poderia se esperar um efeito substituição
do produto, essa elasticidade não é significativa,
aumentando para 0,7. Ou seja, 10% de aumento
permanente de preço têm o poder de reduzir a
demanda em apenas 0,7% no prazo de 20 anos.
Isso reflete a dificuldade em se encontrar um bem
substituto para o petróleo, pelo menos no estágio em
que se encontra o desenvolvimento tecnológico. No
caso dos combustíveis, responsáveis por 50% do
consumo de petróleo, pode haver uma substituição no
longo prazo, tal qual ocorreu com a redução do uso do
petróleo para gerar energia. Porém, para outras áreas,
como a petroquímica, essa substituição é mais difícil.
Pelo lado da oferta o que se nota, em especial nos
últimos três anos, é que os investimentos em aumento
da capacidade de produção de petróleo praticamente
estagnaram. Isso é particularmente importante, pois,
mesmo que esses investimentos fossem retomados,
sabe-se que os mesmos têm prazo de maturidade
longo, que pode ultrapassar os 10 anos. Um dos
limitantes apontados é o alto custo do investimento
para esse setor, que triplicou entre 2003 e 2005 e criou
o cenário do “esperar para ver”. Mesmo o recente
aumento do preço do petróleo provavelmente ainda
não seja suficiente para estimular que esses projetos
saiam do papel, tanto é que a IEA – International
Energy Agency - aponta que a criação de nova
capacidade de produção deve crescer muito pouco nos
próximos cinco anos, aumentando o risco de escassez.
Naturalmente, a combinação de demanda
crescente, não correspondida com maior oferta, irá
resultar em maiores preços. Em um exercício simples,
suponha que o mundo cresça 4,6% a.a. pelos
próximos quatro anos. Isso resultaria em uma
expansão da demanda por petróleo na ordem de
3,13% a.a. Mesmo que a oferta crescesse a uma taxa
de 1,5%, teríamos um desequilíbrio de cerca de 1,6%
ao ano nesse mercado. Nesse caso, como a reação da
oferta no curto prazo é pequena, o preço teria que
crescer 75% para garantir o equilíbrio. E, como
sabemos, aumentos de preços da ordem de 10%
podem reduzir o PIB mundial em torno de 0,25%.
Portanto, não há como esperar que o mundo cresça a
essas taxas sem que haja distorções de curto prazo
ainda maiores na economia.
Por maior que sejam as incertezas sobre essas
projeções, em especial no médio e longo prazo, a
mensagem parece clara: os preços do petróleo devem
continuar subindo, gerando impactos em diversos
outros mercados correlatos.

Fonte: IMF, World Economic Outlook – Oil Scarcity, growth and global
imabalances, april, 2011.

Publicado no Informe Econômico 25/abril/2011

Nenhum comentário:

Postar um comentário