A crise internacional começou a mostrar
o seu lado mais perverso, os indicadores que refletem a fraqueza da atividade
econômica nos EUA e Europa inicia a safra de divulgações negativas. Esse
movimento já era esperado por diversos analistas e, deve ser questão de tempo
para que os noticiários passem a confirmar o que as expectativas já indicam: o
quarto trimestre do ano concretizará a recessão americana e Européia. Dos
indicadores de pedido desemprego nos EUA até as novas encomendas para a
indústria na Zona do Euro, passando pelo PIB do Reino Unido e as exportações do
Japão, o que se vê são números negativos.
Apesar
disso, ainda é possível ver analistas que acreditam que os emergentes podem
desempenhar o papel de “fiel da balança” do crescimento. Ou então, que essa
crise terá impactos pequenos sobre alguns países. Os números recentes também
começam a derrubar essa tese, ou então, a dúvida. Na semana passada o Governo
da China divulgou os dados do PIB do terceiro trimestre, sinalizando que o
crescimento nos nove primeiros meses de 2008 foi de 9,9%. Pode parecer, à
primeira vista, que esse é um resultado ainda espantoso mas, não se deixe
enganar, é uma taxa de crescimento cerca de 2,3 pontos percentuais menor que a
verificada no mesmo período do ano passado, e ainda reflete uma boa parte do
cenário positivo do primeiro semestre.
A expectativa é que, na medida que a
atividade econômica se mostre mais enfraquecida nos EUA e Europa, o que deve
ocorrer exatamente no quarto trimestre desse ano, os números devem arrefecer
ainda mais, produzindo impactos negativos sobre a demanda por todo tipo de
produtos metálicos, agrícolas, energia e de bens de consumo, arrastando para
baixo o preço de diversos itens. O comportamento do preço das commodities já
reflete essa expectativa. E esse será um dos principais canais de disseminação
da crise pelos países emergentes. A Rússia, grande produtor de petróleo e
importante fornecedor de gás para a Europa, já sente a queda de receita com a
exportação desses produtos. Os impactos sobre a arrecadação de impostos do
governo serão nítidos. O Brasil exporta US$ 3,9 bilhões para aquele País, sendo
que, somente de carnes, nos nove primeiros meses desse ano foram US$ 2,1
bilhões. Alguma dúvida de que teremos impactos?
Outro
grupo de países que demonstra fraqueza diante desse cenário é o Leste Europeu.
Hungria, Ucrânia e Polônia são tidas como “bola da vez”. A Ucrânia, um grande
produtor de aço, sente a queda de preço e demanda pelo seu produto e uma menor
receita de dólares, ocasionando problemas na atividade econômica interna com
aumento do desemprego. O FMI divulgou que possui recursos para ajudar os países
em dificuldades, e a Ucrânia negociou um empréstimo de US$ 16,5 bilhões, não
sem antes dar indícios de que esse valor pode chegar a US$ 66 bilhões para
cobrir necessidades de juros e principal da dívida no curto prazo, ao longo de
2009. A Hungria já recebeu US$ 6,7 bilhões do Banco Central Europeu, mas também
sinalizou com pedidos para o FMI. A Argentina, muito dependente das receitas de
exportação de produtos agrícolas, viu na nacionalização de seus fundos de
pensão privados, uma possível solução, que ainda carece de aprovação. Felizmente
os investidores internacionais descobriram que Buenos Aires não é a capital do
Brasil.
E
por aqui? Bem, o primeiro sinal de contágio da crise veio nos contratos de ACC.
De uma média de US$ 250 milhões/dia, tendo momentos de pico, como US$ 600
milhões liberados no dia 11 de agosto, chegamos apenas a US$ 48 milhões no dia
10 de outubro, último dado disponível. Desde o dia 17 de setembro que o cenário
para essa modalidade de crédito não é o mesmo. Na semana passada o Banco
Central ofereceu US$ 2 bilhões ao mercado na tentativa de normalizar essa
situação e, como nem tudo foi captado pelos bancos é bem provável que não
ocorra a normalização dessas operações no curto prazo. Outros sinais de
contágio também se fazem sentir, mas ainda de maneira esporádica. O Banco
Central divulgou que, nos primeiros dias de outubro ocorreu uma queda nas
concessões de crédito no mercado interno. É claro que ainda é um resultado
incipiente e pequeno para reverter um crescimento da ordem de quase 30% em 12
meses mas, ocorre exatamente em um momento delicado do ano, com a proximidade
das festividades de dezembro.
Amanhã e quarta tem reunião do COPOM
para decidir a meta Selic. Será a penúltima reunião do ano. A maioria
das apostas é de manutenção dos atuais 13,75% e, motivos não faltam para
sustentar essa decisão. Primeiro que seria uma enorme contradição aumentar
juros na seqüência de redução dos depósitos compulsórios dos últimos dias.
Seria como dizer que sim e que não para a mesma pergunta. Além disso, o cenário
econômico, interno e externo, modificou-se de maneira drástica desde a última
vez que o COPOM se reuniu, em 9 de setembro. Portanto, apostar em uma “parada
técnica” para dimensionar os impactos dessa crise sobre o mercado de crédito e
a demanda interna, não machucaria a reputação da autoridade monetária. É claro
que existe o risco de repasse de custos por conta da desvalorização cambial.
Porém, há que se considerar que o preço de diversos produtos caiu em dólar,
apesar de ser difícil quantificar o impacto líquido. A resposta para a pergunta
de como o Brasil entra nessa crise, passa pelas mãos do Banco Central nos
próximos 30 dias.
Publicado no Informe Econômico de 27/10/2008
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