quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Indústria: desaceleração ou pé no freio?

Primeiro, todos acreditavam que a crise se restringiria apenas ao mercado de crédito subprime nos EUA. O desenrolar dos acontecimentos pós setembro revelou que muitos estavam errados. Mesmo depois da crise ultrapassar a esfera financeira e atingir o lado real da economia nos países desenvolvidos, a tese do “descolamento” ainda era seguida por alguns. Porém, tal como em um efeito dominó, uma a uma, as economias foram mostrando a capacidade de absorção dessa crise. A desaceleração nos países emergentes passou a ser dada como certa.
Desde então, a crise internacional ganhou destaque nos noticiários nacionais mas, sem sucesso em apontar os efeitos nocivos sobre os indicadores por aqui. Afinal de contas, emprego, renda, vendas do comércio e etc, continuavam a crescer, teimando em dizer que somos uma ilha, influenciando as projeções dos orçamentos públicos para 2009 (o governo federal ainda teima em colocar expansão de 4% do PIB para o próximo ano) e causando a sensação de proteção. Mas calma, quando vemos o depoimento de um empresário sobre a redução de sua carteira de pedidos, ou de ter encontrado dificuldades na comercialização de um produto, é questão de tempo até os indicadores revelarem. Por isso que em um momento de ruptura na economia, como o que presenciamos, é muito importante prestarmos atenção nos números que revelam as expectativas, e não os resultados apresentados pelos indicadores de atividade, que retratam apenas um movimento passado. Assim, a partir do momento que as pesquisas começarem a captar esses resultados, o que se espera é uma maior preocupação das pessoas com os impactos da crise.

No último informe econômico, descrevemos a tortura que foi necessário fazer para convencer os dados de emprego de outubro a nos revelar que alguma coisa estava errada. A divulgação dos dados de produção industrial na semana passada, confirma a tese de que o pior mês de outubro dos últimos 10 anos para a indústria brasileira não era um fato isolado. Infelizmente esses dados cooperaram de imediato, e já contaram todos os problemas: a produção da indústria brasileira em outubro cresceu apenas 0,9% em relação a outubro de 2007, é o pior resultado dos últimos 29 meses, interrompendo, assim, uma série de 20 meses de expansão da ordem de 6,5%.
Olhando desse prisma, ainda há quem possa dizer que os impactos da crise serão limitados. Tudo depende da famosa interpretação entre “metade do copo cheio ou metade vazio”. A verdade é que está difícil de definir sobre uma desaceleração ou um pé no freio. Para tanto, devemos recorrer a mais informações desagregadas. Nesse caso, há subsetores onde a queda no mês de outubro pode ser entendida como pé no freio, como é o caso da extração de carvão mineral, que teve uma retração recorde de -42% sobre o mês de outubro de 2007. Na seqüência, a indústria ligada ao agronegócio, com produção de adubos e fertilizantes retraindo (-31%), defensivos agrícolas (-30%), produção de sucos e concentrados de frutas (-24%) e fabricação e refino de açúcar (-16%). Outros do grupo “pé no freio”, estão relacionados á indústria de bens intermediários, como é o caso dos petroquímicos básicos e intermediários, (-18%), Laminados de material plástico (-16%) e produtos de madeira (-13%). Por fim, um dos poucos da lista de semi-duráveis, a  produção de calçados, (-12%).
Podemos formar o grupo da “desaceleração” considerando aqueles que reduziram a produção em menor magnitude. É o caso, por exemplo, da indústria de abate de carne e aves, beneficiamento de arroz essas duas, por sinal, muito importantes para o Rio Grande do Sul e refino de óleos vegetais. Além desses, temos o grupo metal-mecânico, com uma importante cadeia produtiva, e que apresentou desaceleração em praticamente todas as atividades. Algumas chamam a atenção, como é o caso da produção de tratores, eletrodomésticos da linha branca (geladeira, fogão e máquinas de lavar), material elétrico e a parte da indústria automobilística, passando pelo subsetor de peças e acessórios.
É claro que existe uma ilha, e está relacionada à construção civil. Atividades como produção de vidro e produtos de vidro, cimento e clíquer, artefatos de concreto e fibrocimento, continuaram a apresentar números elevados. Porém, é uma questão de tempo até que os efeitos de restrição de crédito possam percorrer o caminho entre posto de venda de imóveis e decisão de investimento das empresas até as encomendas aos fornecedores. 
Na semana passada, também foi divulgada a sondagem industrial da FGV para o mês de novembro. Um dos pontos mais importantes apresentados foi o maior número de empresários que assinalara estar com um nível de estoques acima do desejado. A necessidade de adequar a produção com os estoques e as vendas, já deve repercutir nos indicadores de horas trabalhadas de novembro. Além disso, é bem provável que a produção industrial no mês de novembro tenha se retraído mais que o verificado em outubro. Porém, esse resultado só conheceremos no início do ano que vem. Ainda há pessoas otimistas, em especial no governo, e que acreditam que essa crise vai passar pelo Brasil como uma “marolinha”. Por via das dúvidas, compre uma bóia.


Publicado no Informe Econômico de 08/12/2008

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