Escrever novamente sobre a crise
internacional e seus impactos no Brasil ou no Rio Grande do Sul pode parecer
repetitivo. Mas, até o momento, os eventos mais marcantes estiveram
relacionados ao mercado internacional, com uma ou outra passagem por questões
de cunho financeiro no Brasil, como menor fechamento de ACC – adiantamentos de
contratos de câmbio maiores taxas de juros nos empréstimos bancários e o relato
de dificuldades das empresas em conseguirem recursos para financiar seu fluxo
de caixa. Para muitos, a crise parecia um “ser extraterrestre” e que, olhando
para o retrovisor de dados da economia brasileira, que retratam nossa solidez
macroeconômica, estaríamos com escudos capazes de nos proteger do pior.
Pois bem, parece que a partir da
divulgação dos dados do mercado de trabalho formal no Brasil, referentes ao mês
de outubro, saímos do campo da “especulação”, e podemos dizer que fomos
abduzidos pela crise.
De uma maneira geral, a performance do
mercado de trabalho formal no mês de outubro não foi dos piores. Afinal de
contas, continuamos a gerar vários postos de trabalho no País, foram 61 mil
naquele mês. Não é o recorde histórico que vínhamos presenciando nos meses de
outubro passados, como os 205 mil em 2007. Porém, para convencer o leitor de
que esse resultado pode ser a “luz amarela” na estrada do crescimento
sustentável, será necessário torturar bastante dos dados até que eles confessem
a realidade. E conseguimos.
O resultado de outubro é o pior dentre
todos os meses de outubro dos últimos cinco anos. Na análise setorial, podemos
ver que a agropecuária e o comércio não tiveram números tão ruins. Outubro e
novembro são meses de maiores contratações no comércio e, mesmo que em menor
ritmo, parece que o setor está apostando em um natal ainda positivo. Mas, o que
chama a atenção são os resultados da indústria de transformação, que teve o
pior mês de outubro dos últimos 10 anos. Foram apenas 8,7 mil empregos gerados
no Brasil. Regionalmente podemos ver algumas disparidades. Tradicionalmente a
indústria de Minas Gerais fecha postos de trabalho no mês de outubro mas, a
proporção verificada, com a demissão de 29,4 mil trabalhadores, só tem paralelo
com 1998. Para compensar esses números, a indústria de São Paulo, responsável
por 36% dos empregos do setor no Brasil criou 34 mil postos de trabalho. Seria
uma boa notícia não fosse o fato de que esse é o menor número desde 2004.
E o Rio Grande do Sul? Os dados gaúchos
também tiveram que ser torturados. Em outubro, ocorreram 8,7 mil contratações
adicionais (já considerando as demissões). Que bom, continuamos a gerar
empregos. Sim, mas é o menor valor desde 2002. Migrando para a análise
setorial, há informações mais importantes. Aqui, como no Brasil, os resultados
para a agropecuária e o comércio foram normais. Mas, a indústria gaúcha teve o
pior resultado dos últimos 10 anos no mercado de trabalho formal, com o
fechamento de 1,17 mil postos de trabalho.
A abertura dos dados da indústria
comprova o que se percebia. A crise irá atingir setores e regiões em momentos e
intensidades diferentes. Selecionamos três segmentos que chamam a atenção. O primeiro
deles é uma surpresa. É a primeira vez no Plano Real que a indústria
metalúrgica gaúcha fecha empregos em outubro. Não bastasse isso, está na
contra-mão do resultado verificado no Brasil, que teve 1,8 mil contratações. A
indústria mecânica, outro segmento importante no complexo metal-mecânico do
Estado, também teve o pior mês de outubro da história. O que há de comum nesses
dois resultados é o fato de ambos pertencerem a uma cadeia produtiva que
responde de maneira rápida a crises de demanda, como a que presenciamos nesse
momento. Com o aumento da incerteza, que reduz o fluxo financeiro, aumenta os
custos dos empréstimos e reduz prazos, há redução no volume de comercialização
de produtos de maior valor final, relacionados a juros e crédito. Esse é o caso
dos segmentos de bens de capital e bens de consumo duráveis.
O terceiro segmento que chama atenção é
o calçado. Tudo bem que o mesmo já vinha de um cenário difícil sob o impacto de
todos os fatores negativos que o atinge diretamente, como câmbio valorizado e
etc. Mas, o fechamento de 1,9 mil empregos em outubro é o maior da história
para esse mês. Seus impactos estão concentrados em oito municípios do Estado,
com destaque para o Vale dos Sinos, com 1,4 mil vagas a menos naquele mês.
O quadro pode não ser tão negativo
quando se observa o agregado. E podemos ainda insistir que estamos esperando
uma “marolinha”, e que os resultados de outubro podem ser vistos como “um ponto
fora da reta”. Porém, prefiro assumir a posição de alerta e, acreditar que, no
mínimo, o mercado de trabalho formal no Brasil perdeu a dinâmica que vinha
mostrando nos tempos áureos de céu de brigadeiro desde 2003. Afinal, o que
podemos esperar? A linha de frente da crise foi o setor exportador, com a
restrição de crédito, e a indústria, com a queda repentina na demanda. Os
sinais de redução das horas trabalhadas estão para aparecer, e devem confirmar
novos números ruins para o mercado de trabalho. O comércio deve ser o segundo
pelotão a sentir a crise, provavelmente ainda nesse final de ano.
Publicado no Informe Econômico de 01/12/2008
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