segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Está cada vez mais caro produzir no Brasil

Há diversas medidas de competitividades disponíveis para os analistas de plantão. Nesse conjunto, um indicador muito conhecido na literatura internacional é a competitividade-custo, que pode ser representada a partir do custo unitário da mão-de-obra (ULC) medido em dólares. Apesar de útil, pouco se vê de comentários sobre sua evolução nos relatórios de economistas feitos para o Brasil. Dois motivos podem ser apontados pelo baixo interesse que se dá a essa medida. Em primeiro lugar, de uma perspectiva histórica, as exportações no nosso passado recente, tem uma relevância relativamente pequena, comparada com o mercado interno, o que reduzia a importância desse indicador para análises agregadas. Em segundo lugar por, sistematicamente, o País conviver com taxas de câmbio depreciadas, o que contribuía para aumentar a competitividade das empresas no cenário internacional, sem lançar mão de medidas mais detalhadas.

Porém, essa realidade está se modificando. A corrente de comércio do Brasil passou de 12% do PIB em 1995 para 21% no PIB no ano passado. A sustentabilidade e o sucesso do Plano Real está na consolidação de uma composição entre metas de inflação, superávit primário e câmbio flutuante. Assim, a maior abertura comercial e a estabilidade da taxa de câmbio nos anos recentes, aumentaram a importância da medida de custo do trabalho para as empresas exportadoras. Mas, engana-se quem pensa que o custo medido em dólar impacta apenas os exportadores. Se a valorização da taxa de câmbio for tal que crie uma janela de mercado para o produtor externo, certamente seus produtos serão colocados no mercado interno. Portanto, custos de produção maiores devem ser vistos como empecilhos para quem pretende competir no exterior, assim como para um produtor que vende apenas no mercado interno.
Trabalho desenvolvido por Bonelli e Fonseca (1998), mostrou que o principal determinante da perda de competitividade da indústria brasileira na década de 1990 foi o crescimento do salário médio em dólares. A despeito da valorização da taxa de câmbio no período pós Plano Real, os autores ressaltam também que tal aumento de custo teve contribuição muito maior dos reajustes de salário em reais. Além disso, notou-se forte relação entre os aumentos de custo unitário do trabalho e menor rentabilidade das exportações e menor saldo comercial. Como pode ser visto, “não há almoço de graça”. Aumentos sistemáticos de salário real, se não compensados com maior produtividade, terão como resultado imediato uma menor competitividade. Não acredite quem quiser.
O cenário econômico dos últimos cinco anos enseja que essas estimativas sejam reprisadas, como forma de desmistificar questões relacionadas à competitividade setorial. O custo unitário do trabalho deve ser entendido como o custo total da mão-de-obra para a fabricação de uma unidade de produto. Se as comparações são dentro do País, usar os salários medidos em moeda nacional é suficiente. Porém, se a intenção é comparar a evolução dos custos com o mercado internacional, então devemos usar a taxa de câmbio. Assim, aumentos de salário quando medido em dólar, tem como resultado uma menor competitividade setorial. Por outro lado, a produtividade tem o poder de reduzir esse impacto. Assim, maiores reajustes de salário em reais, bem como valorizações da taxa de câmbio, podem ser compensadas via produtividade.
Analisando os dados da indústria brasileira para os últimos quatro anos, nota-se que o ULC está em um nível 94% maior, representando uma taxa de crescimento de cerca de 18% ao ano. Essa seria a magnitude de perda de competitividade a partir dessa medida. Além disso, a decomposição do indicador revela que, no período 2004-2007, os aumentos de salários reais na indústria só foram compensados em parte pela maior produtividade. Portanto, podemos afirmar que o maior impacto nos custos unitários do trabalho tem sido derivado da valorização da taxa de câmbio real. Mas, como a indústria nacional se posicionou no cenário internacional com tamanha perda de competitividade? Três fatores podem contribuir. Em primeiro lugar a redução de margens de lucro na atividade exportadora, mesmo em um ambiente de maior demanda e níveis de preços. Em segundo lugar, a rigidez de contratos e, por fim, o fato de que o Brasil é um grande exportador de produtos relacionados à extrativa mineral. De outra forma, para não negar os impactos que esse maior custo produzem sobre a atividade industrial, basta ver que os saldos comerciais setoriais já sinalizam déficits.
Projetando o ano de 2008, infelizmente podemos ver que a medida de ULC deve continuar a aumentar. Dada uma produção industrial de cerca de 5,8%, o aumento da força de trabalho em 2,2% deve gerar ganhos de produtividade da ordem de 3,5%, em linha com a média dos últimos quatro anos. Não há motivos para acreditar no inverso. Supondo uma valorização média de 10% no ano para o câmbio, resta verificar como se comportariam os salários médios em reais. Se esses ficarem estáveis, já teremos custos de produção nesse ano 10% superiores ao de 2007. Está cada vez mais caro produzir no Brasil.

Bonelli, R.;Fonseca,R. Evolução da competitividade da produção manufatureira no Brasil, IPEA, texto para discussão nº574, 1998.

Publicado no Informe Econômico de 23/06/2008

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