Em primeiro lugar, não há um risco sistêmico no setor
financeiro da mesma dimensão do presenciado na “crise do subprime”, a despeito da presença de vários títulos em carteira que
podem não valer tanto quanto se contabilizava. A comparação entre os testes de stress feitos nos EUA e na Europa irá
permitir apenas inferir que os bancos americanos estão mais bem posicionados
que seus pares europeus, porém, líquidos o suficiente para enfrentar novas
turbulências.
O segundo fator de diferença é a origem das “dúvidas”.
Anteriormente, estas pairavam sobre o crédito e seu colateral. Agora,
questiona-se a capacidade dos diversos governos em honrar seus compromissos de
curto e médio prazo. Ou seja, é um problema fiscal, típico de governos
acostumados a gastar mais que arrecadam. Isso não é novidade, e esse desequilíbrio
foi, durante muitos anos, facilmente administrado com crescimento econômico. Ao
romper esse lastro, expõem-se as fragilidades e a necessidade de ajuste
estrutural dos gastos públicos. Uma medida que tem custos políticos que já
fazem suas vítimas nos dois continentes. Daí a dificuldade em solucionar de vez
essa crise, criando um impasse que apenas serve de mais combustível para
aumentar a incerteza nos mercados de ativos.
A aprovação de ampliação do limite de dívida do
Governo nos EUA é o exemplo mais recente. Criado em 1917, o limite estatutário
foi revisto mais de 100 vezes, principalmente em recessões, onde aumenta a
necessidade de se usar a política fiscal, junto com a monetária, para
impulsionar a economia. A última aprovação, feita no final do mês de julho, é a
que carrega o maior valor financeiro e, ao mesmo tempo, uma exigência de
contrapartida sem precedentes para sua liberação. É nesse ponto que reside
parte da volatilidade dos mercados. Ao apontar a necessidade de cortes
orçamentários para um prazo de 10 anos, e o custo político da negociação para
aumentos posteriores nesse limite, a economia americana perde o apoio fiscal
para enfrentar a crise no curto prazo. Em um cenário com juros próximos a zero,
a consequência imediata, e que os mercados colocaram no preço dos ativos, foia
previsão de menor crescimento até o final de 2012. Nota-se que esse quadro é muito
diferente dos problemas financeiros de 2008.
Sendo assim, o nome mais correto para essa segunda onda seria “crise
fiscal”.
O Brasil se insere nesse contexto de maneira singular
não só em relação a outros países, mas, também, em relação ao passado. É claro
que vamos sentir seus efeitos, ainda mais se o preço de importantes commodities continuar a cair e a nossa
demanda por exportações retrair-se. A principal argumentação para o
enfrentamento dessa crise é que temos reservas de dólar em caixa, sendo uma
parte substancial desse recurso em títulos de dívida dos EUA (cerca de US$ 205
bilhões) e também um sistema financeiro capaz de dar sustentação a um possível
cenário de liquidez. O diagnóstico está correto, mas, o que preocupa é o
remédio que está sendo prescrito: mais crédito. Uma vez que se entenda que a
natureza dessa segunda crise é outra, o governo deve ter a clareza de oferecer
um tratamento diferente: controle do gasto público, como forma de abrir espaço
para redução dos juros. Certamente os benefícios irão aparecer ao fim desse
ciclo de ajuste no cenário internacional.
Publicado no Jornal do Corecon 16/agosto/2011
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