domingo, 10 de agosto de 2014

China: desaceleração, sim. Recessão, não!

Uma breve revisão sobre a conjuntura
econômica da China indica que o ritmo de
crescimento será menos intenso nos próximos
meses. O relatório com desempenho da economia
em maio, registrou indicadores de atividade mais
fracos em relação a abril. Essa deve ser a tônica para
os próximos meses, um crescimento mais moderado,
principalmente, dos investimentos. Porém, esse
resultado está longe de representar um esgotamento
do modelo de desenvolvimento chinês, mas tem um
caráter de adequação da atividade para evitar
distorções, como, por exemplo, as provocadas pela
inflação e excesso de liquidez.

Assim como ocorreu no Brasil, o governo
chinês usou de uma política fiscal contra cíclica para
evitar uma recessão durante o pior período da crise
internacional. Contudo, deve ser destacado que
houve diferença no método de promover esses
estímulos. Na China, a expansão fiscal foi baseada
nos gastos com investimentos em infra-estrutura,
aqueles que ficam para o futuro e elevam o
crescimento do produto potencial. No Brasil, a
política focou nos estímulos ao consumo e na
expansão dos programas de transferências de renda.
Outra diferença foi que a China adotou uma política
deliberada de forte desvalorização cambial,
adotando o dolar-peg. Essa medida ajudou a
promover exportações, mas que não pode ser
mantida por um longo período, pois podem resultar
em sérias distorções para a economia. Em ambos os
casos, os mecanismos foram eficazes e após a
retomada do crescimento vieram os riscos de
superaquecimento e inflação.
O economic leading index calculado pelo
National Bureau of Statistics of China é uma
compilação de indicadores antecedentes para a
economia chinesa e tem grande capacidade de
previsão do desempenho da atividade econômica no
curto-prazo. Assim, constitui-se numa ferramenta
importante para traçar os rumos da terceira maior
economia do mundo nos próximos meses. O índice
sinalizou queda na atividade, passando de 104,4
pontos em abril para 103,4 em maio, depois de ter
atingido seu maior valor em 16 anos no quarto
trimestre de 2009. Esse resultado foi puxado pela
desaceleração nos investimentos e na produção. A
produção industrial expandiu a uma taxa mais lenta
pelo terceiro mês consecutivo. No acumulado do ano
até maio o valor adicionado pela indústria avançou
18,5% em termos anualizados, ante os 19,1% de
abril. O mesmo movimento se observou nos
investimentos planejados em novos projetos, que
diminuíram para 26,5% nos primeiros cinco meses
do ano, o que representa um pé no freio se
comparado como a expansão de 42,8% no período de
janeiro e fevereiro ou de 67% no final de 2009. Ou
seja, o próprio governo chinês tenta induzir o
desaquecimento da economia pela via do
investimento.
Destaca-se que nas últimas décadas, a China
mostrou um boom de produtividade como
conseqüência dos altos investimentos em todas as
áreas e urbanização. A taxa média de investimento
como proporção do PIB ficou acima a 35%, no
período 1980-2009, o que implicou num crescimento
de produtividade da mão de obra na ordem de 8% ao
ano. Além disso, no início dos anos 80 apenas 20% da
população estava na zona urbana, em 2010 será
próximo a 50%.
A desaceleração que observaremos será
puxada justamente pelo resfriamento dos
investimentos na área urbana. Impulsionado pela
retração nas construções de residências. Em nota
conjuntural do Banco Central da China (BPoC) há
uma clara menção de que governo central tem
controlado a liberação de novos projetos de infraestrutura
através da redução dos financiamentos e
corte de novos projetos. Para conter um risco de
superaquecimento e controlar a inflação a China
continuará retirando estímulos da economia. Esse
movimento também se observa no orçamento fiscal
para 2010, que apresentou uma leve mudança de foco,
com maior peso para os gastos com saúde e educação.
Desse modo, espera-se que o crescimento
anualizado de 11,9% no primeiro trimestre não será
repetido ao longo do ano. A expectativa é de um
esfriamento da economia no segundo semestre,
quando a expansão do PIB deve ficar na casa dos 9%,
resultando num crescimento anual em torno de 10,1%
em 2010. Da mesma forma, segundo o FMI, para
2011, também é projetado um crescimento entre 9% e
10%. Visto que no período pré-crise a economia
avançou a taxas de 11,6% a.a. e 13% a.a. em 2006 e
2007. Para os padrões chineses, crescer 9%
representará uma desaceleração. Apesar desse
esfriamento, a taxa de inflação continuará acelerando.
Projeta-se que, a economia que conviveu com uma
taxa de inflação média anual de 1,8% no período
2000-2009, presenciará um aumento contínuo nos
preços, que subirá para 2,25% ao ano no período
2010-2015.
Os resultados indicam que o desaquecimento
da economia é planejado e terá um caráter corretivo,
não configurando uma mudança de tendência. O
principal objetivo parece ser o de adotar uma posição
mais cautelosa de acordo com a conjuntura de
incerteza mundial, abrindo caminho para uma
economia mais voltada para o mercado interno.

Publicado no Informe Econômico 05/julho/2010

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