segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Câmbio: chegamos até aqui. Mas, para onde iremos?

           A trajetória do câmbio nos últimos anos foi de forte e persistente apreciação. Desde janeiro de 2006 até junho de 2008, o câmbio sofreu uma valorização de 71% (considerando o câmbio médio do mês). Esse comportamento pode ser explicado por, basicamente, três justificativas. A primeira deriva da relação saldo comercial/ corrente de comércio. A teoria econômica afirma que quanto menor a corrente de comércio maior o impacto que o saldo comercial terá sobre a formação do câmbio e sua volatilidade. No caso brasileiro, durante um longo (e recente) período, acumulou-se grandes superávits comerciais relativos à corrente de comércio.

            Em 2005, essa razão saldo/corrente era de 23%, em 2006 foi para 20%, para, por fim, em 2007 registrar 14%.  A diminuição da relação saldo comercial/corrente de comércio traz indícios de que o processo de valorização do câmbio sofrerá uma menor contribuição desse componente que, certamente, foi o principal responsável por ele nos últimos anos.
A segunda razão é o movimento de capitais das três naturezas: investimento direto, em bolsa e em renda fixa. No primeiro caso, a estabilidade econômica e política do país, o imenso mercado interno, o potencial de crescimento, e, obviamente, associado a isso, a grande liquidez internacional, fizeram do Brasil um ambiente propício à recepção de investimentos produtivos. As aplicações em bolsa, por sua vez, se justificam diante da grande rentabilidade oferecida nos últimos anos e, as aplicações em renda fixa, em resultado ao grande diferencial de juros da economia nacional em relação à praticada nos demais países. Por fim, há o próprio movimento internacional de desvalorização da meda americana, que agora o governo indica que tomará medidas para evitar a manutenção desse cenário.
            Será que a valorização do câmbio continuará? Se sim. Pelo menos no curto prazo esse movimento não será tão intenso quanto recentemente, apesar da obtenção do grau de investimento. Por outro lado, afasta-se também as possibilidades de uma crise do Balanço de Pagamentos motivada pelo déficit em Transações Correntes, como se verificou no passado, que poderia levar a um processo de desvalorização cambial. Os dados de maio já provaram que o ritmo de deterioração das Transações Correntes diminuiu. Espera-se, atualmente, que as Transações Correntes encerrem o ano com um déficit de R$ 25 bilhões. O déficit de mai/08 foi de US$ 650 milhões como resultado da recuperação do superávit comercial em US$ 4,1 bilhões. As remessas de lucros ao exterior são decrescentes desde março, e de acordo com a sazonalidade da série, devem continuar esse movimento em junho. Vale ressaltar que dois setores perderam capacidade de envio: automotivo e financeiro (principais remetentes ao exterior no início do ano, com a intenção de “tapar” os buracos causados pela crise do subprime nas matrizes). Os dados de viagens internacionais, porém, continuam registrando fortes aumentos.
            Se o processo de deterioração das Transações Correntes não fará com que o Banco Central opere vendendo dólares no mercado para evitar uma desvalorização do câmbio, como alguns chegaram a sugerir, tampouco é de se esperar que a autoridade monetária continue compondo reservas, pelo menos com o ritmo que vinha tendo. Em 2006, o Banco Central comprou aproximadamente US$ 30 bilhões. Em 2007, a composição de reservas incitou a aquisição de cerca de US$ 90 bilhões. Para esse ano, espera-se que o Banco Central compre cerca de apenas US$ 15 bilhões. Novamente, várias são as razões para tal comportamento. A primeira é que diferentemente de 2006 e 2007, em 2008 o Brasil passa por uma situação de aperto monetário. Quando o país compõe reservas e está num processo de controle inflacionário, vê-se obrigado a esterilizar a moeda nacional que disponibilizou no mercado. Com a inflação crescente, o Banco Central retomou o processo de aumento da taxa de juros e com isso encareceu o processo de esterilização. Em um regime de câmbio flexível, em que se espera a estabilidade câmbio e distancia-se as possibilidades de uma crise no Balanço de Pagamentos, associado a um aumento do custo de composição das reservas, não é razoável se esperar um comportamento de compra dólares por parte do Banco Central.
            Nesse cenário, pergunta-se: qual será a taxa de câmbio a vigorar no país no final do ano? Atualmente, as expectativas de mercado são de que a taxa de câmbio encerre o ano em R$ 1,65/US$. Porém, observa-se que desde 2004, as expectativas têm sido sempre mais desvalorizadas que o câmbio efetivo. Fazendo-se um exercício de comparação das expectativas, num horizonte de 6 meses antes, com o realizado, verifica-se que a média de erros é de em torno 9%, isto é,o realizado foi cerca de 9% mais valorizado que a expectativa previa. Com isso, poderíamos esperar que em novembro, o câmbio esteja em torno de R$ 1,54/US$, ao invés de R$ 1,65/US$ como as expectativas de mercado de meados de junho previam para esse mês.
            O que se pode concluir é que devemos esperar no curto e médio prazo ainda um processo de valorização cambial, porém menos intenso e com menores intervenções do Banco Central. Todavia, a crise do subprime não revelou ainda todas as suas perdas mundo a fora, e conforme as surpresas forem surgindo, poderá haver uma maior volatilidade no câmbio.

Publicado no Informe Econômico de 14/07/2008

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