domingo, 10 de agosto de 2014

A história do setor elétrico no Brasil

A história do setor elétrico brasileiro pode
ser dividida em cinco fases, de seu surgimento, em
1879 aos dias de hoje. Entender esse processo, ajuda
a identificar os problemas estruturais no setor, seja
no fornecimento de energia ou na tarifa cobrada.
Nesse primeiro informe, de uma série de dois,
abordam-se as quatro primeiras fases.
O Brasil do início do século passado ainda
era predominantemente rural mas o rápido
crescimento demográfico nas cidades, alimentava a
demanda por energia elétrica. Nesse período,
ocorreu uma forte entrada de capital estrangeiro,
constituindo vários concessionários e produtores
independentes espalhados pelo País. A Iº Guerra
Mundial interrompeu, momentaneamente, os
investimento que só retornaram por volta de 1920
com importantes fusões e aquisição de empresas. O
País entra na crise de 1929, com duas empresas que
praticamente dominavam o mercado interno, a Light
e a Amforp.

Essa, que é citada como uma das maiores
crises da história contemporânea, gerou muitas
discussões sobre o papel do Estado na Economia, e
influenciou decisões políticas futuras que duraram
até recentemente. Um exemplo disso foi a entrada do
estado como produtor no segmento de energia
elétrica em vários países da Europa e também nos
EUA. No Brasil, a escolha foi a regulação, fase essa
que durou até 1944. Apesar de não estar diretamente
relacionado à produção, o estado brasileiro tomou
duas medidas que influenciaram a formação do
setor: (i) a concentração de poderes na legislação nas
mãos da União; (ii) a permissão de novas concessões
somente feita para empresas nacionais.
As discussões que ocorreram, a partir de
então, entre o setor privado e o governo, inclusive na
fixação de tarifas, acabou por afugentar o capital
estrangeiro. A conseqüência imediata foi o menor
nível de investimento, contribuindo para gerar um
descompasso entre a capacidade de ofertar e o
crescimento da demanda, em especial por parte da
indústria. A formação desse “gargalo” na produção,
foi determinante para influenciar a decisão de o
Estado passar de regulador para produtor.
Assim é que, a partir de 1945, inicia-se a
terceira fase da história da energia elétrica no Brasil,
caracterizada pela forte presença do estado na
geração, transmissão e distribuição. Nitidamente, o
setor de energia elétrica era visto como estratégico
pelo governo federal, para o sucesso das medidas
que seriam adotadas no Plano de Metas. Assim é que
as ações públicas, seja na construção ou
incorporação das companhias estrangeiras,
culminaram na criação de grande parte das
companhias estaduais de energia, que passaram a
assumir as atividades de geração e distribuição nos
seus estados, como a CHESF, Cemig, CEEE,
CEMAT, COELBA, dentre muitas outras.
Na esteira dessas modificações estruturais,
veio uma série de medidas institucionais que visavam
dar mais consistência ao funcionamento do setor no
Brasil. Um marco importante foi a unificação das
tarifas nacionais ainda em 1974. Independente de
onde se gerava a energia, para onde ia, e o perfil de
renda da região, as tarifas eram únicas. Essa ação foi
importante para gerar um equilíbrio econômicofinanceiro
nas empresas que, mais capitalizadas,
voltaram a investir. Assim, a presença do Estado
como produtor, foi a marca da terceira fase do setor no
Brasil, que se encerra em 1975.
Talvez esse modelo durasse mais tempo não
fossem os diversos choques externos e problemas de
gestão que o setor passou nos anos seguintes. Os
sinais de fadiga já puderam ser sentidos no início da
década de 1980, na esteira da elevação dos juros no
cenário internacional. Os desequilíbrios resultantes
nos balanços de pagamentos de diversos países em
desenvolvimento, dificultaram a condução da política
fiscal e monetária, em especial no Brasil. As
constantes desvalorizações cambiais e aumento dos
juros, desestruturaram a economia do País, e o
governo não conseguia conter o processo
inflacionário. Nesse ambiente, uma das medidas mais
comuns era a contenção das tarifas do setor elétrico.
Além disso, os estados também fizeram uso das
empresas como meio de financiamento indireto de
seus déficits fiscais. Porém, mesmo com receitas em
queda, a necessidade de investimentos fez com que a
maior parte dessas empresas expandisse suas
atividades de empréstimo, aumentando sua
alavancagem, buscando dólares para equilibrar o
balanço de pagamentos do país. Para deteriorar ainda
mais esse quadro, o início da década de 1990 é
marcado pelo aumento da inadimplência, seja das
estatais com a Eletrobrás ou então dos governos
estaduais com as estatais. Não é difícil perceber que
essas ações debilitaram a capacidade de geração de
caixa do setor, tendo como conseqüência, a redução
dos investimentos e a formação de um novo “gargalo”
para o País.
Assim é que a quarta fase do setor, que vai de
1975 a 1995, é caracterizada pelos problemas de
gestão pública nas empresas, ficando nítida a falência
do modelo estatal. Nas novas propostas de reestruturação
do setor no país, passou-se a cogitar,
novamente, a participação da iniciativa privada mas,
sob um sistema de concessões de serviços públicos.

Schilling, M.D.; Morais, I.A.C. A desigualdade tarifária no setor elétrico
gaúcho, texto para discussão, Departamento de Economia, Unisinos, 2009.


Publicado no Informe Econômico 14/setembro/2009


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