domingo, 10 de agosto de 2014

A economia está "superaquecendo"?

O dados oficiais de crescimento do PIB do
Brasil no 1º trimestre de 2010, devem ser
conhecidos na semana que vem. Porém, não é
necessário esperar a divulgação para confirmar o que
já se suspeita: em vários ramos de atividade
produtiva estamos crescendo além da capacidade. E
diversos são os indícios de que cada vez mais
devemos ter um cenário de desaceleração para o ano
de 2011.

O primeiro está relacionado ao
comportamento dos índices de preços. Como se
sabe, esses servem para refletir desequilíbrios
macroeconômicos que podem ter diversas fontes.
Por isso que é comum o cálculo de diferentes índices
de inflação, cada qual procurando refletir o
comportamento de um dado setor da economia,
consumidores ou então, grupos diversos e separados
por faixa de renda, idade e etc. E os sinais emitidos
pela inflação contribuem para interpretar a
conjuntura como “aquecida além da capacidade”.
Pelo lado da oferta, os índices de preços no
atacado, conhecidos como IPA, são boas referências
para avaliar o comportamento dos custos pagos na
cadeia produtiva. O IPA industrial, que reflete o
comportamento do agregado, teve variação de -
3,47% em todo o ano de 2009, verificando deflação
em vários meses. Um reflexo de uma atividade
econômica que ainda se ressentia da queda da
demanda. Porém, só nos quatro primeiros meses de
2010 já acumula alta de 3,26%. Em alguns itens a
variação é muito maior, como é o caso de Papel e
Celulose, Produtos Químicos e da Metalurgia, 5,4%,
7,5% e 8,2%. Deve-se ter cuidados ao avaliar o
comportamento desses preços pois muitos refletem
também a oscilação do câmbio e o comportamento
da demanda externa, uma vez que envolvem itens
considerados commodities. Porém, nesse mesmo
período, o câmbio pouco oscilou e a atividade
econômica continua fraca em outros países. Ou seja,
é possível que boa parte da pressão de custos tenha
como fonte o mercado interno. Outro ponto é que o
IPA é utilizado para sinalizar como deverá ser o
comportamento dos índices de preços ao consumidor
no futuro, em especial na parte de produtos. De fato,
a inflação medida pelo IPCA já reflete uma demanda
aquecida. Em todo o ano de 2009, o IPCA variou
apenas 4,31%. Mas, de janeiro a abril já está em
2,65%. Se o padrão de evolução de preços dos
quatro primeiros meses de 2010 se mantiver para o
resto do ano, desconsiderando a questão da
sazonalidade, a inflação poderia terminar o ano em
8,1%. Os investidores já perceberam essa mudança
de comportamento dos preços nas expectativas
divulgadas semanalmente pelo Banco Central. No
último relatório essa está em 5,67%, bem acima da
meta de 4,5% e se aproximando da chamada “banda
superior”.
Outro segmento que reflete a rápida expansão
da demanda na economia brasileira é o da construção
civil. Com os investimentos programados em novas
obras de infra-estrutura e na construção de edifícios, o
mercado de trabalho está aquecido. Nos últimos doze
meses terminados em abril, ocorreu uma expansão de
8% nos empregos formais no Brasil, um total de 299,6
mil pessoas a mais. Somente nos primeiros quatro
meses do ano foram 166,1 mil. A rápida recuperação
também se reflete no comportamento dos preços de
materiais para o setor. Em 2009, o custo médio por m2
aumentou 1,9% no Brasil. Somente nos quatro
primeiros meses desse ano já acumula 3,8% de
aumento, exatamente o dobro do verificado em todo o
ano passado. O mesmo se verifica para os custos da
mão-de-obra. Em algumas regiões, o reajuste
verificado chega a dois dígitos, como é o caso do
salário/hora de um mestre-de-obras em Minas Gerais,
que se expandiu 15% nos últimos doze meses, e 9,7%
no Paraná. Reflexo de um mercado de trabalho
aquecido além da capacidade. A última sondagem
industrial do Rio Grande do Sul apontou que 76% dos
empresários do ramo de construção civil encontram
dificuldades em encontrar mão-de-obra especializada.
Uma terceira sinalização de aquecimento da
economia vem do setor externo. As importação
cresceram 42% nos quatro primeiros meses desse ano,
contra apenas -26% em todo o ano passado. Somente
com a importação de petróleo é US$ 1,3 bilhão a mais
sobre os quatro primeiros meses de 2009. Uma
expansão de 63%. E a importação de matérias-primas
mostra elevação em vários outros produtos, como o
aumento de 56% em laminados longos e planos de aço
e 53% de componentes eletrônicos. O crescimento da
renda e o câmbio valorizado também contribuem para
a alta no consumo de bens duráveis, como
computadores, que acabam por impulsionar a
importação de equipamentos de informática, 100% de
crescimento sobre os quatro primeiros meses de 2009.
E a importação de automóveis, camionetas e utilitários
cresceu 71%, cerca de US$ 1,1 bilhão sobre 2009.
A avaliação desse cenário é no intuito de
lançar luzes sobre a configuração da economia
brasileira no curto prazo. Depois de queda expressiva
da atividade econômica, o aumento do gasto público
combinado com câmbio valorizado e expansão
desenfreada do crédito, parece ter “turbinado” a
economia além do possível. É difícil aventurar sobre a
magnitude do aumento de juros programado para a
reunião da próxima semana. Mas, um fato é concreto:
em 2011 não há condições para a economia brasileira
continuar a crescer dessa forma.

Publicado no Informe Econômico 31/maio/2010

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