terça-feira, 29 de julho de 2014

EU SEI O QUE VOCÊS NÃO FIZERAM NO ANO PASSADO

A economia brasileira conseguiu aproveitar–se do cenário internacional positivo dos últimos anos, com os fundamentos atestando esse movimento de mudança nos indicadores macroeconômicos. Apesar disso, a única medida tomada foi a de não implementar o que se defendia em campanha. Porém, a liquidez de capitais e o apetite pelo risco foram tão elevados nesse período que até países em situação de default recente, conseguiram captar recursos. Assim, de alguma forma, os investidores fecharam os olhos para o fato do Brasil não ter completado algumas reformas estruturais importantes e, nem sequer, iniciado outras e apostaram na economia do País.
No início desse ciclo de prosperidade, a demanda externa era a maior responsável pelo nosso desempenho. Em 2003, a expansão do PIB foi de 1,16%, com uma contribuição negativa por parte da demanda interna em -0,99 p.p. A compensação por essa retração veio com a melhor demanda externa, que teve contribuição de 2,15 p.p. Reflexo dos bons resultados das exportações, e um movimento ainda pequeno nas importações. Porém, na medida que as condições internas foram ficando mais favoráveis, essa composição foi se modificando e, em 2004, a demanda interna já era responsável pela maior contribuição para o PIB, a despeito da ainda positiva contribuição do setor externo.

Ressalta-se que a queda continuada da taxa de juros, juntamente com a melhora nas condições de crédito, foram elementos determinantes para alavancar a demanda interna. Adiciona-se a esse cenário, o bom momento vivido pelo mercado de trabalho, com a expansão dos empregos e do salário real e a valorização do câmbio, que pressionou para baixo o preço dos produtos importados. Consolidou-se, então, as condições para um maior consumo das famílias. Ressalta-se que esse se tornou o principal vetor do crescimento interno e, as projeções indicam que, em 2007 devem ter uma expansão de 5,8%, a maior desde a implementação do Plano Real.
Para completar esse quadro, vale destacar os maiores gastos públicos, que cresceram nos últimos anos a uma velocidade maior que a arrecadação de impostos, a ponto de ter se constituído em uma pedra no sapato da política econômica. Hoje a taxa de juros só não é menor por conta dos maiores gastos públicos.
Tanto o maior consumo das famílias, quanto do governo, estão pressionando a demanda interna e contribuindo para a redução do gap do produto, ou seja, a distância entre o produto potencial e efetivo. A boa notícia é que a Formação Bruta de Capital Fixo, os investimentos, também estão se expandindo. Na esteira de taxas de juros menores, os investimentos devem crescer cerca de 10% em 2007, o maior avanço em um único ano desde o controle inflacionário. A absorção de bens de capital no mercado doméstico bateu recorde nesse ano, sinalizando que está ocorrendo um elevado nível de investimento no País. Os indicadores revelam a coordenação de um forte movimento de importação de máquinas e equipamentos com a expansão da produção interna de bens de capital. Tal cenário sinaliza melhores níveis de investimento no ano da mesma forma que deve resultar em uma melhor composição da estrutura produtiva setorial no futuro. Elemento importante, em um ambiente de câmbio valorizado, para gerar fôlego para uma maior competição, tanto no mercado interno quanto no mercado externo.
Apesar disso, a taxa de investimento sobre o PIB ainda estará aquém da necessária para garantir a sustentabilidade do crescimento da economia brasileira no patamar de 5% no médio prazo. Da mesma maneira que o País apresenta uma relação investimento/PIB bem menor do que a verificada em outros países. Dessa forma, aumentar essa relação constitui em um dos maiores desafios para a economia brasileira nos próximos anos, e a ausência de reformas importantes, como a tributária, trabalhista e previdenciária, reduzem as chances de se alcançar esse objetivo.
       O cenário que se coloca para a economia brasileira no ano de 2008 deve permanecer positivo. Apesar das pressões inflacionárias advindas de um preço do petróleo mais elevado e de não se configurar no horizonte uma interrupção na tendência de aumento no valor das diversas commodities metálicas e de alimentos, o peso da balança pendeu mais para os riscos de recessão do que de inflação nas economias desenvolvidas. Em especial, depois dos impactos financeiros do mercado subprime. Apesar disso, as sinalizações são de que a economia mundial caminha para o sexto ano consecutivo de crescimento acentuado. E as projeções feitas para o Brasil nesse ambiente, permanecem positivas, e são potencializadas pelo fato de adentrarmos no ano de 2008 com indicadores macroeconômicos saudáveis.
      Porém, nunca é cedo demais para lembrar que os investidores ainda avaliam o Brasil como um País que oferece riscos no médio e longo prazo. E não é por ter menor dependência de capitais externos, boas reservas de petróleo, potencial no mercado de biocombustível e a perspectiva de atingir o grau de investimento em 2008, que estaremos imunes a mudanças no ambiente financeiro. Se houver maior aversão ao risco, o País será alvo de discussões. E seria como se nos dissessem: “eu sei o que vocês não fizeram no ano passado”.

Publicado no Informe Econômico/FIERGS 10/12/2007


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