terça-feira, 29 de julho de 2014

O QUE FAZER COM AS RESERVAS

O cenário internacional benigno dos últimos anos, que esteve ancorado no forte crescimento do comércio, foi fator determinante para a ampliação do fluxo de capitais para países emergentes. Para conter pressões sobre a taxa de câmbio, diversos Bancos Centrais compraram moeda, e boa parte desses recursos foi utilizada para engordar suas reservas financeiras. Atualmente, estima-se que o total de ativos estrangeiros em poder de Bancos Centrais e de Governos, chegue a US$ 7,5 trilhões, ver IMF(2007). Desse total, US$ 5,6 trilhões seriam denominados de reservas internacionais, e outros US$ 1,9 trilhão na modalidade de fundos de renda soberanos.
Ressalta-se que manter todos os ativos de um país em moeda, ouro ou títulos de dívida de outros países, como normalmente são compostas as reservas internacionais, não gera os retornos financeiros adequados para os países que acumulam recursos. E esse custo é maior quanto mais elevadas forem as taxas de juros internas relativamente ao retorno obtido com a aplicação dessas reservas. Atento a esse movimento, o mercado financeiro internacional desenhou uma nova modalidade de investimento, os fundos de renda soberanos, ou como são denominados, SWF (Sovereign Wealth Funds). Esses fundos não são novos, e seus maiores clientes são os países que possuem fartos recursos naturais, como é o caso dos grandes produtores de petróleo ou então de commodities agrícolas ou metálicas.

A disponibilidade de aplicação é ampla. Um país pode escolher, por exemplo, um fundo de investimento que tenha como objetivo promover a estabilidade de seu balanço de pagamentos. Nesse caso, em tempos de bonança, com preço em alta dos produtos que exporta, pode engordar o fundo. Em momentos de depressão do preço no mercado internacional, os recursos podem ser usados para mitigar os efeitos negativos sobre o balanço de pagamentos. Um exemplo desse tipo de fundo de estabilização é o Oil Stabilization Fund, criado pelo governo da Rússia, e que tem ativos totais de cerca de US$ 127 bilhões. Assim, a redução da volatilidade do balanço de pagamentos contribui para melhorar a administração das políticas monetária e fiscal no país.
Por outro lado, pode-se escolher investir uma parte dos ativos em um fundo de poupança de mais longo prazo, que tem o objetivo de transferir para gerações futuras os benefícios presentes com o uso de recursos naturais que não são renováveis. Há também os fundos que podem ser usados apenas para aumentar a rentabilidade das reservas. Nesse caso, o perfil é de mais curto prazo, e muitas vezes são inclusive contabilizados no item reservas. Encaixam-se nessa modalidade as aplicações em títulos de outros países.
Mas, de todas essas opções, há duas que chamam a atenção e que, devido o atual patamar de reservas no Brasil, poderiam, pelo menos, serem passíveis de estudo para implementação: os fundos para reserva previdenciária e os fundos de desenvolvimento.
No primeiro caso, o fundo tem o caráter de garantir o financiamento de aposentadorias, reduzindo os impactos negativos de desequilíbrios do sistema devido a choques diversos, como por exemplo, envelhecimento da população, aumento da informalidade, queda da taxa de natalidade, dentre outros. Com isso, tem-se uma fonte de financiamento do déficit menos onerosa para a sociedade do que os impostos ou contribuições. Alguns países já utilizam esse mecanismo, como a Noruega (Government Pension Fund com US$ 308 bilhões) e o Chile (Pension Reserve Fund com US$ 1,37 bilhão). Ressalta-se a necessidade de tal fundo vir acompanhada de uma política de investimento e administração que seja coerente com as metas definidas e também com transparência para toda a sociedade.
O segundo tipo de fundo de investimento considera que parte dos ativos conseguidos nos períodos de bonança, são alocados em um fundo que tem como objetivo financiar projetos sociais no próprio país. Nessa modalidade pode-se incluir desde programas de acesso à educação, até investimentos em infra-estrutura urbana ou de comércio, como estradas, portos e hidrovias. A única ressalva sobre essa modalidade de alocação de recursos são os impactos que podem causar sobre a demanda interna, com potenciais inflacionários. Porém, há mecanismos fiscais que podem ser utilizados para mitigar esses efeitos, como por exemplo, o uso de superávit primário.
       Diversos países já trilham a estratégia de melhor alocar seus ativos em reservas do que simplesmente financiar outras economias com a compra de títulos soberanos. A posição de outubro das reservas no Brasil era de US$ 167 bilhões, dos quais US$ 143 bilhões estão alocados em títulos de emissores externos, como por exemplo, os T-bonds do governo americano. A despeito do motivo liquidez para fazer frente a necessidades urgentes, se apenas 10% das reservas fosse destinada para a modalidade SWF que tivesse, como objetivo, melhor dotar a economia brasileira de infra-estrutura, já teríamos mais do que a proposta fiscal do PAC para o ano de 2008, e poderíamos ter um alívio fiscal com a redução da CPMF.

IMF – Global Financial Stability Report, Financial Market turbulence: causes, consequences and policies, September, 2007.


Publicado no Informe Econômico/FIERGS 19/11/2007

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