A conjugação de crescimento econômico internacional
acentuado e estável, nos últimos cinco anos, coloca em perspectiva um cenário
comparável apenas ao verificado no pós-segunda guerra mundial. Mesmo diante das
recentes turbulências nos mercados de crédito imobiliário nos EUA, de um nível
do preço do petróleo em patamares historicamente elevados e das constantes
tensões políticas no Oriente Médio, a economia mundial não apresenta sinais de
arrefecimento, e as perspectivas são de manutenção dos atuais níveis de
crescimento. Afinal de contas, que elementos e fatores estão permitindo esse
cenário? Ao final da década de 1950, em momentos de paz, a reconstrução de
diversos países na Europa, a maior confiança dos consumidores americanos e a
explosão da produção de bens de consumo duráveis, em especial nos EUA, dentre
outros fatores, foram essenciais para a consolidação de um cenário de
crescimento que durou quase dez anos. Apesar dessa aparente similaridade de
performance, o ciclo atual apresenta particularidades interessantes que o diferenciam
de todos os demais.
Na década
de 1960, o crescimento americano era acompanhado apenas por uma dezena de
países, como os tigres asiáticos e, em certa medida, alguns coadjuvantes na
América Latina. Atualmente, o ciclo de expansão tem a contribuição de diversos
países em todos os continentes, e os mais importantes personagens nesse
processo são a China e a Índia. Hoje, a contribuição da América Latina é maior,
há ainda diversos países Africanos e também o Leste Europeu. Podemos afirmar
que praticamente todos os países estão se beneficiando, em certa medida, do
atual ciclo. Vale destacar que em 2006, os países emergentes representaram
cerca de 40% do PIB mundial e 2/3 do crescimento verificado. Além disso, foram
responsáveis por cerca de 1/3 de todo o comércio mundial. Portanto, não apenas
a maior participação de países no atual ciclo de crescimento mundial representa
um fator de diferenciação com o passado, mas também, o fato de que o conjunto
dos emergentes revela maiores contribuições.
O ponto
importante a destacar é que o processo de integração comercial e financeira se
intensificou nas últimas décadas, aumentando a interdependência entre os países
e contribuindo para tornar mais estável a produção. Da mesma forma que o
aumento das relações comerciais permite ganhos de escala e eficiência para as
empresas, a integração financeira possibilita a diversificação de riscos e a
convergência de taxas de juros entre as economias. Em nenhum momento da
história mundial ocorreu tanto fluxo de capitais entre países desenvolvidos,
entre os últimos e os emergentes e entre os próprios emergentes.
Diversos
estudos, ver IMF(2007), também apontam que os governos dos países desenvolvidos
estão implementando uma política monetária e fiscal mais neutra, o que tem sido
útil para estabilizar a balança entre crescimento e inflação. Ou seja, as
reações de política monetária a momentos de choques, como o ocorrido
recentemente no mercado de crédito americano, se diferenciam das respostas de
trinta anos atrás. Além disso, os canais de transmissão dessas políticas estão
mais limpos e eficientes, resultado do avanço nas comunicações e na integração
financeira. Porque não dizer que as instituições tornaram-se mais transparentes
e confiáveis, contribuindo para a redução das incertezas dos investidores e
consumidores. Hoje é possível acessar dados de receita e despesas de governos
com uma defasagem de tempo mínima, avaliar mais de uma centena de indicadores
econômicos e antecipar possíveis problemas e, acima de tudo, ter certeza de que
as regras serão cumpridas. Porém, esse ainda é um desafio a ser superado pelos
governos de diversos países emergentes, que ainda se encontram às voltas com
problemas institucionais, menor transparência nos dados públicos e regras pouco
críveis.
A história
econômica nos mostra que os períodos de forte crescimento por vezes foram
seguidos de momentos de ajuste nos países. Uma característica que parece
intrínseca ao sistema capitalista. Porém, como pode ser visto, a teoria
econômica evoluiu na sugestão de soluções para essas questões e, ao longo dos
últimos anos, os países foram moldando as suas políticas fiscais e monetárias,
além de permitirem o surgimento de instituições mais confiáveis e sólidas, de
tal forma a reduzir os custos desses ajustes. Similarmente, a inserção mundial
em uma maior integração econômica, seja pela via comercial ou financeira,
contribuiu para reduzir as excessivas oscilações na produção. Apesar da
aparente calmaria, os desafios que se colocam para as autoridades
internacionais nesse processo, vão desde a manutenção da neutralidade das
políticas monetária e fiscal sobre a produção, até a melhora no controle dos
mercados de crédito, passando pela continuação da integração comercial e
financeira. E os países emergentes possuem grande responsabilidade nesse
ajuste, na exata medida em que passaram a desempenhar papel de destaque no
cenário mundial. Apesar do bom relacionamento entre crescimento econômico e
estabilidade, devemos nos lembrar que os movimentos cíclicos da economia ainda
existem.
IMF – The Changing Dynamics of the
Global Business Cycle, WEO, October, 2007.
Publicado no Informe Econômico/FIERGS
29/10/2007
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