O histórico de fluxo de capitais para
países emergentes apresenta dois momentos com comportamento acima da média. O
primeiro ciclo ocorreu no início da década de 1990 e durou até meados de 1996,
quando então, as sucessivas crises – México, Ásia, Rússia e Brasil – reduziram
quase a zero os investimentos em emergentes. O segundo ciclo teve início no ano
de 2002, na esteira da redução das taxas de juros nos países desenvolvidos, em
especial nos EUA, e dura até hoje. Nesse cenário, os países classificados como
Emergentes da Europa (são 13 no total), respondem pela maior parcela relativa
de captação de recursos. Porém, há duas diferenças importantes a destacar entre
esses dois momentos, que é a existência de uma via de mão dupla do
investimento. Ou seja, o atual ciclo de fluxo de capitais ocorre não apenas
para emergentes, mas também dos emergentes, um sinal de que as empresas desses
países também estão procurando oportunidades em outros mercados e se tornando
globais. Uma segunda diferença é que, apesar de existir um fluxo financeiro,
denominado de investimento de portfólio, a maioria dos recursos são capitais
carimbados como investimento direto, que possuem características de mais longo
prazo e são estáveis.
Além disso, o excesso de capitais que
flui para esses países tem tido outro destino que o verificado no passado.
Basicamente, pode-se notar de forma geral, que esses recursos foram usados para
solucionar problemas de conta corrente, como verificado na América Latina e na
Ásia Emergente, ou então direcionados para acúmulo de reservas. A exceção nesse
processo é o grupo dos Emergentes da Europa, que apresentam uma piora no
déficit em conta corrente. Por um lado, o fluxo de investimento gera impactos
positivos sobre alguns indicadores econômicos locais, como a melhora no balanço
de pagamentos, a intensificação do processo de integração comercial e financeira
e a transferência de tecnologia pelas empresas. Porém, por outro lado, tem
implicações importantes sob o ponto de vista macroeconômico, em especial na
apreciação cambial com resultante perda de competitividade, e aquecimento
econômico acima do potencial.
Recente estudo do IMF(2007), aponta as
implicações macroeconômicas de um intenso e rápido fluxo de capitais para um
país e as lições que se pode tirar desse processo. Pela experiência histórica,
boa parte desses episódios de intenso fluxo, cerca de 1/3, foi interrompida de
forma abrupta ou então seguidos de uma crise cambial. Tal fato sinaliza que
esse cenário não é raro de acontecer. Além disso, essa interrupção no fluxo
costuma ser seguida de taxas de crescimento menor do PIB, da ordem de 3 pontos
percentuais a menos que o verificado durante o período de entrada de recursos.
Apesar dos riscos e custos existentes no período pós-fluxo intenso, os Bancos
Centrais em diversos países aprenderam com as crises do passado e a experiência
internacional na administração desse cenário deixa boas indicativas de como
minimizar esses prejuízos. Em primeiro lugar, já se tem claro a impossibilidade
em se administrar, em uma economia aberta, um sistema que tenha, ao mesmo
tempo, taxa de câmbio fixa, política monetária independente e com perfeita
mobilidade de capitais. Esse é o conhecido paradigma da “tríade”. E o Brasil já
passou por experiência parecida. O sistema de taxa de câmbio administrada,
entre 1995 e 1999, vigorava em um cenário de livre movimentação de capitais.
Tal política demandava a composição de reservas robustas para fazer frente a
desequilíbrios entre oferta e demanda por dólares no curto prazo. E isso
resultava em se ter menor autonomia na política monetária. O rompimento desse
sistema permitiu o ajuste entre a oferta e a demanda por dólares, o movimento
de capitais continuou livre e passamos a ter maior controle sobre a política
monetária. Atualmente, o trade-off da
decisão do Banco Central está entre apreciação da taxa de câmbio e inflação.
As lições com as experiências de outros
países mostram que fluxo intenso de capitais, apreciação cambial, demanda
interna aquecida e déficit em conta corrente não são combinações desejadas.
Tais economias estão mais expostas a riscos macroeconômicos quando da reversão
do fluxo de capitais. Dentre os países em desenvolvimento, aqueles
classificados como pertencentes ao grupo de Emergentes da Europa são os que
apresentam a pior combinação: aquecimento da economia, apreciação da moeda e
aumento do déficit em conta corrente. Um remédio útil para essas ocasiões é o
controle do gasto público, que pode ao mesmo tempo reduzir as pressões sobre a
valorização cambial e reduzir impactos no período pós-fluxo de capitais.
Por hora o fluxo de capitais tem sido
uma boa oportunidade para que os países emergentes resolvam pequenos
desequilíbrios macroeconômicos, como redução da exposição de dívida externa,
maiores taxas de crescimento com conseqüente resultados sobre os indicadores
sociais. Porém, os riscos com a reversão desse fluxo, que já atinge o maior
nível na história contemporânea (US$ 500 bilhões previsto para 2007), ainda se
fazem presentes e, apesar da América Latina apresentar situação positiva nos
indicadores macroeconômicos, não estamos livres de sofrer os impactos de uma
nova aversão a risco como a verificada em 1997.
IMF, Managing Large Capital Inflows, WEO,
2007.
Publicado no Informe Econômico/FIERGS
05/11/2007
Nenhum comentário:
Postar um comentário