A revisão da metodologia de cálculo do
PIB – Produto Interno Bruto representou muito mais do que uma melhora da coleta
e processamento dos dados que retratam a realidade da economia brasileira. A partir
do momento em que passaram a ser utilizadas as pesquisas anuais do IBGE, feitas
para a indústria, comércio, construção civil, gastos das famílias e situação do
domicílio das mesmas, e também o uso de informações constantes no IRPJ (Imposto
de Renda Pessoa Jurídica), a estimativa do PIB do Brasil ganha em qualidade,
mas às expensas de maior prazo para divulgação dos dados definitivos.
O resultado final, largamente
anunciado, foi um aumento da taxa de crescimento média dos últimos anos, em
especial no período de 2002-2006. Seria como se os números nos informassem que
ficamos mais ricos do que imaginávamos. A despeito dos resultados estatísticos,
vale destacar os impactos positivos que essas re-estimativas produziram sobre
outros indicadores da economia. O mais importante resultado está na queda da
relação dívida líquida/PIB. Com isso, investidores e o próprio governo
descobriram que, mesmo sendo ainda a dívida elevada em termos absolutos, pouco
mais de R$ 1 trilhão, ela é menor diante da riqueza produzida no país em um
ano.
Dessa forma, conclui-se que o superávit primário, como percentual do PIB,
que seria necessário para reduzir a relação dívida/PIB, é menor. Uma conclusão
importante para decisões sobre a política monetária e fiscal, e também para as
decisões de investimento, em especial de investidores externos. Sendo assim, a
se manter a meta de superávit primário sobre o PIB de 4,25% para os próximos
quatro anos, especula-se que o Brasil possa atingir a avaliação de “investment grade”, mais cedo do que se
imaginava. Motivos suficientes para causar euforia.
Porém, essa argumentação está embasada
apenas na análise das estatísticas. Nos últimos anos, as agências
internacionais que fazem essa classificação de risco passaram a incluir outras
variáveis para avaliar os países. Dentre essas, as questões estruturais, que
contemplam o setor previdenciário, sistema tributário e o mercado de trabalho.
E, como se sabe, isso não é feito por uma mudança metodológica. Mesmo assim, muito se comemorou os novos
números de crescimento mais acentuado.
Sem querer acabar com a festa, essa é
uma visão econômica míope do País e uma avaliação mais detalhada dos resultados
revelam na verdade, uma piora na nossa estrutura produtiva. Comparando com as
estatísticas anteriores, a nova metodologia revela que a taxa de investimento
no Brasil é menor do que acreditávamos, o que nos coloca em um patamar bem
abaixo do verificado pelos nossos concorrentes diretos no cenário
internacional. Vale destacar que essa é uma conseqüência de uma menor taxa de
poupança interna. O cenário nacional só não se deteriorou diante da menor
poupança interna porque a conjuntura internacional, com a elevada liquidez de
capitais, contribuiu de forma positiva. Ou seja, há poupança externa para
complementar os investimentos. E o maior vilão, como mostram os dados do IBGE,
é o próprio setor público, que continua a avançar sobre a disponibilidade de
poupança do setor privado. Esse poupa, e aquele absorve uma parte dessa
poupança para financiar seus gastos, seja correntes, seja com juros.
Seguindo a teoria econômica e também o
desempenho histórico de outros países, sabemos que quanto maior for a taxa de
poupança, maior será o investimento. Sendo assim, com a revisão que colocou
para baixo a taxa de poupança no Brasil, podemos concluir que o País está mais
distante do tão sonhado cenário de crescimento de 5% ou mais, ao ano, do que
imaginávamos. Não há como sustentar no médio prazo esse nível de crescimento
somente com a expansão da demanda. É necessário que os investimentos produtivos
acompanhem essa evolução, sob pena do Banco Central promover novos aumentos de
juros para controlar o excesso de
consumo, interrompendo pressões inflacionárias.
Tudo bem, mas estamos crescendo mais do que se
imaginava. Novamente uma afirmação que não interpreta a nova metodologia de
maneira mais minuciosa. Como se sabe, o cálculo do PIB contempla os impostos
que são pagos sobre a produção. Assim, se aumenta a arrecadação de IPI e outros
impostos que incidem sobre a produção, por exemplo, então pode-se esperar haja
uma contribuição positiva destes para o valor final do PIB. Na revisão feita, o
IBGE encontrou que, em todos os anos analisados (2000 a 2006) o total de
impostos que incidem sobre a produção aumentou em relação ao valor que se tinha
calculado anteriormente. Conclusão óbvia: estamos pagando mais impostos.
Conclusão menos óbvia e não divulgada: boa parte do crescimento do PIB, tanto
em valor quanto em taxa percentual, deve-se ao maior nível de impostos. Na
metodologia anterior, os impostos sobre os produtos representavam 11% do PIB
total. Agora, representam 14%. Isso representa cerca de R$ 104 bilhões a mais.
Não há dúvida que a nova metodologia
representa uma melhora em termos de qualidade e transparência dos dados e na
relação entre os agentes econômicos no Brasil. Mas também revela uma piora na
estrutura de produção, com o setor público tirando espaço do setor privado. Os
novos dados não revelam que o brasileiro ficou mais rico, mas sim que o governo
continua a avançar sobre a riqueza produzida no País.
Publicado no Informe Econômico/FIERGS 09/04/2007
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