Um dos
movimentos mais conhecidos na literatura econômica é o efeito defasagem. Uma
redução ou elevação da taxa de juros, um corte ou majoração de alíquotas
tributárias, a modificação na política fiscal, as mudanças cambiais e uma série
de outras oscilações na economia, produz impactos não apenas no mês seguinte,
mas também nos próximos, podendo se arrastar inclusive por mais de anos. Assim
é que se trabalha com a hipótese de que investimentos das empresas no presente
resultam em maior capacidade de oferta na economia no futuro, e modificam o
patamar de emprego e renda do País.
Mas, além das
já conhecidas modificações de política econômica, há aquelas que são mais
silenciosas e que, mesmo assim, não deixam de promover resultados positivos. Um
exemplo muito interessante é a economia do Chile. De uma situação no qual o
estado controlava tudo, e o governo ocupava todos os espaços, não restando
quase nada para o setor privado, o País mudou radicalmente sua linha de
política econômica após as reformas implementadas pelo governo de Augusto
Pinochet no início da década de 1970. Durante os anos que se seguiram, o Chile
conviveu com privatização de empresas estatais ineficientes, abertura econômica
a partir de acordos bilaterais, uma disciplina fiscal que teve impactos
positivos sobre o controle da inflação além de uma condução de política
monetária de acordo com um Banco Central responsável.
Tais atitudes
foram de primordial importância para dar consistência econômica ao País para
atravessar a crise mundial do início da década de 1980, e rapidamente se
recuperar nos anos seguintes. E os dados confirmam essa assertiva. De meados da
década de 1980 até a crise da Ásia em 1997, o PIB do Chile cresceu a uma taxa
média de 7,2% ao ano. Obviamente um impacto positivo defasado das reformas
estruturais implementadas nos anos anteriores e que contribuíram para elevar a
taxa de investimento no País. Mas, vale destacar que o Chile não fez todas essas
reformas em um único momento. As mesmas foram implementadas em partes. O ponto
mais importante é que foram feitas de maneira contínua, e não oscilaram ao
sabor das opiniões do governo que estava no poder.
O setor de
mineração, um dos mais importantes para a economia local e primordial na pauta
de exportações do País, é um exemplo dessas transformações. No início da década
de 1980, somente o estado podia explorar essa atividade com uma das maiores
empresas do Chile, a CODELCO. A partir da inclusão na constituição de 1980 da
possibilidade de concessão dessa exploração no setor por empresas privadas, os
investimentos aportaram nos anos que se seguiram. Como resultado, as companhias
privadas hoje produzem muito mais cobre do que a estatal e a um custo bem mais
baixo. Não há como duvidar que boa parte da contribuição para o crescimento do
PIB do País nos anos que se seguiram tenha vindo desses investimentos.
Mas, no período
entre 1998 e 2005, a taxa média de crescimento do Chile reduziu-se para 3,5% ao
ano. Tal resultado pode parecer pequeno relativamente ao verificado em anos
anteriores, mas está condizente com a performance de uma economia madura, que
já abandonou o grau de emergente, e se encontra em outro patamar de
desenvolvimento. Além disso, não há mais choques de produtividade guardados na
gaveta à espera de reformas para poderem impulsionar a economia. O País
apresenta instituições transparentes e estabilidade de preços e leis, o que se
reflete na atração de investimentos e também na estabilidade da taxa de
crescimento. Um cenário diferente da economia brasileira, que ainda aguarda
choques de produtividade via reformas estruturais para mudar o patamar de sua
taxa de crescimento, a despeito de mudanças metodológicas produzirem esse
efeito.
A propósito, a
recente revisão dos dados do PIB do Brasil, feitos pelo IBGE, confirmam o
efeito defasado acima exposto, em especial com o aumento da participação do PIB
do setor de telecomunicações entre 1995 e 2005. Vale destacar que isso é o
resultado de uma performance do setor bem acima da média das demais atividades
produtivas durante esse período. Como se sabe, em meados da década de 1990 o
governo brasileiro promoveu um programa de privatizações no setor de
telecomunicações. Nos anos que se seguiram, os investimentos eclodiram, e
passados menos de 10 anos tem-se quase que uma universalização do acesso da
população a linhas de telefone, seja com fio, ou então celular. Se o governo
brasileiro tivesse dado seqüência a esse programa, estendendo as privatizações
a outros setores que ainda apresentam ineficiência e distorção produtiva, como
é o caso do setor bancário e extração de petróleo, é bem provável que a atual
revisão do IBGE colocasse o desempenho do PIB do País em patamares ainda mais
elevados.
A ausência das reformas estruturais nos últimos quatro anos,
com os baixos investimentos privados em um cenário no qual as instituições não
oferecem segurança contratual, o avanço do setor público sobre a economia, e o
baixo grau de abertura comercial, limitam o chamado “PIB potencial” para os
próximos anos. O efeito defasado não é apenas teórico, mas também empírico. Se
o Brasil fizer o dever de casa hoje, com as reformas estruturais necessárias,
podemos mudar o patamar de crescimento amanhã.
Publicado no Informe
Econômico/FIERGS 02/04/2007
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