terça-feira, 29 de julho de 2014

ESTAMOS LIVRES DE UMA RECESSÃO MUNDIAL?

Há tempos que se analisa o comportamento cíclico de indicadores econômicos para o embasamento de previsões. O mais conhecido é o ciclo de produção agrícola, que ainda desafia profissionais ligados ao tema em todo o mundo. Apesar disso, muito se aprendeu com os movimentos de expansão e queda da produção em determinadas culturas, e como outras variáveis importantes como o clima, a produtividade, o uso de produtos químicos e de avanços científicos, influenciam esses movimentos.
Além disso, os economistas passaram a investigar como a idéia de movimentos cíclicos se aplicava em outros setores produtivos, em especial na indústria e vendas no comércio, e também no consumo privado e investimento. Os estudos nessa área tinham como foco principal identificar padrões que pudessem orientar as políticas econômicas, com o intuito de reduzir os impactos negativos produzidos por uma recessão, independentemente de sua origem.

 Naturalmente foi possível verificar que esses movimentos cíclicos tinham uma relação estreita entre as diferentes variáveis e países. No primeiro caso, uma queda da produção estaria associada a uma retração no nível de emprego, com conseqüente queda da massa de salários, consumo e vendas do comércio e todos os demais efeitos na economia. Vale ressaltar que, apesar desses movimentos não ocorrerem em idênticos momentos no tempo, as relações eram claras. Assim, foi possível construir indicadores que retratam e sinalizam os potenciais impactos de uma recessão.
No segundo caso, o objeto de investigação passa a ser como o aumento ou queda da produção em um país ou região, poderia afetar outros países ou regiões, o chamado efeito “spillover”. Na medida em que aumenta o grau de integração comercial e financeira entre as economias, é de se supor que uma crise localizada em um determinado país pudesse se espalhar por outros países em um efeito dominó.
O aumento do preço do petróleo produziu resultados negativos sobre a atividade econômica mundial no início e no final da década de 1970, assim como também o período de alta de juros na primeira metade da década de 1980 derrubou a atividade econômica mundial. Da mesma forma pode-se avaliar a crise do setor de tecnologia em 2001, que teve o potencial de atingir diversos mercados no mundo e, para tanto, usou o canal da integração financeira.
Porém, é importante destacar que esses choques eram de natureza comum a todos os países, ou seja, um preço maior do barril de petróleo e uma redução coordenada do preço dos ativos nos mercados acionários, impactam toda as economias, possuindo essas um maior grau de abertura comercial e financeira ou não. Desde então, os ciclos recessivos mundiais tornaram-se menos freqüentes, a despeito da maior integração, e estiveram associados muito mais a movimentos localizados e com impactos regionais. Tal cenário pode ser comprovado com a crise do México em 1995, da Ásia em 1997 e da Rússia em 1998, restritos a determinadas regiões, e países emergentes e que não produziram uma retração econômica de proporções globais.
O cenário econômico mundial encontra-se em perfeita harmonia há mais de cinco anos, com crescimento na Ásia, Europa e América e redução do risco nos países emergentes. As exceções situam-se em pequenas intempéries políticas localizadas no Oriente Médio e na Venezuela, mas o mercado já assimilou seus impactos em um preço médio do barril do petróleo mais elevado, descartando a possibilidade de choques de maiores proporções como na década de 1970. Tal avaliação é importante, pois sinaliza que a construção de uma crise econômica em escala mundial tem poucas chances de ocorrer no médio prazo.
Apesar disso, a redução do ritmo de crescimento da economia americana enseja impactos sobre a atividade produtiva em outros países, dada a sua importância sobre o PIB mundial (cerca de 20% do total) e a intensa inter-relação comercial que possui com outras regiões (os EUA participam com 11% das exportações mundiais). Recente relatório do FMI, o WEO (World Economic Outlook), analisa esses e outros efeitos dos movimentos cíclicos coordenados.
Os resultados sinalizam que a perspectiva de uma menor taxa de crescimento do PIB dos EUA não é descartada, porém, dada a origem localizada de sua causa, o desaquecimento do mercado imobiliário, seus impactos globais devem ser limitados. Os maiores prejudicados devem ser setores específicos exportadores para os EUA, e países limítrofes, como o Canadá e o México. De qualquer maneira, a ponderação desse desaquecimento com a atividade produtiva em outras regiões deve manter o equilíbrio econômico internacional.
Não se descarta a incidência de crises de proporções globais, mas seus riscos são menores diante de um cenário de coordenação de política macroeconômica, em especial num regime de metas de inflação. À exceção de um choque de origem global, os ciclos econômicos mundiais devem ser menos sincronizados, com potenciais de impactos mais locais do que gerais. Aos poucos vamos aprendendo a lidar com os movimentos cíclicos da economia.

Publicado no Informe Econômico/FIERGS 16/04/2007


Nenhum comentário:

Postar um comentário