Apesar do
crescimento econômico sincronizado de diversos países no mundo nos últimos
quatro anos, e a perspectiva positiva para 2006 (+ 4,9% de expansão do PIB), há
riscos no cenário internacional que colocam em dúvida a continuidade desse processo.
Em especial, destacam-se os desequilíbrios nas contas externas e a evolução do
preço da energia. Um documento recente do FMI (World Economic Outlook) explora os impactos sobre a economia
mundial de um aumento do preço do petróleo no mercado internacional, a partir
de três questões fundamentais: o canal de transmissão de um choque de aumento
do preço do petróleo; como os recursos financeiros obtidos pelos países
exportadores do produto, os chamados petrodólares, tem impactado os mercados
financeiros regionais; e, como as respostas de política macroeconômica podem
afetar o comportamento da poupança e do investimento.
É importante
ressaltar que o preço do petróleo ainda apresenta uma defasagem relativamente
ao seu maior valor histórico, ocorrido no início da década de 1980, US$
91/barril, em valores reais. Mesmo assim, o atual patamar tem implicações
importantes do ponto de vista de equilíbrio na conta corrente entre os países,
sobre os investimentos e também sobre a renda. No primeiro caso, parece claro que
os maiores prejudicados devem ser os países importadores dessa commoditie, que devem experimentar uma
deterioração na conta corrente, depreciação cambial, aumento dos juros internos
e redução na demanda doméstica (PIB). No caso dos EUA, as estimativas são de
que, no espaço de um ano, para cada US$ 10 de aumento permanente no preço do
petróleo, haja uma redução de cerca de 0,5 ponto percentual no PIB conjugado
com um aumento de 0,75 p.p. na inflação.
Por outro
lado, os exportadores de petróleo podem se beneficiar desse cenário na medida
em que aumentam as suas receitas de exportação em dólares. Nesse caso, o mais
importante é separar os efeitos sobre a renda que são de caráter transitório
daqueles permanentes. Na expectativa de uma modificação na renda que seja
transitória, o aumento de receita desses países não deverá resultar em maior
demanda por importações pois acreditam que logo o preço do produto irá recuar
e, com isso, sua renda. Por outro lado, se a percepção dos produtores é de que
a modificação na riqueza será permanente, então pode-se esperar uma modificação
sobre as decisões de alocação entre consumo presente e futuro. Diferentemente
do ocorrido nos dois outros choques do petróleo, 1973-74 e 1979-81, a atual
evolução do preço não está concentrada em um curto espaço de tempo. Além disso,
é cercada, de um lado pela expansão continuada do crescimento econômico da
China e dos EUA, o que mantém a demanda pelo produto aquecida e, de outro, com
a crescente tensão no mercado produtor, aumentam-se as incertezas sobre a
manutenção da oferta do produto no curto prazo. Esses ingredientes, em
conjunto, contribuem para aumentar a percepção de mudança permanente na renda
por parte dos países exportadores de petróleo. Destaca-se que essa modificação
na renda não é desprezível. Entre 1999 e 2005, o valor das reservas de petróleo
dos países da OPEP aumentou para cerca de US$ 40 trilhões. Sendo assim,
qualquer mudança na percepção de renda, por menor que seja, tem potencial de
gerar um forte impacto sobre a demanda global.
O que se
observa no cenário financeiro internacional no momento, é que os exportadores
líquidos do produto estão poupando esses dólares, e os redirecionando para a
compra de títulos de países emergentes e no financiamento dos déficits em conta
corrente nos EUA. No primeiro caso, os resultados têm sido positivos com a
redução risco-país. Entretanto, o segundo caso representa um financiamento com
potencial risco para o equilíbrio financeiro internacional. De um lado, não há
sinais de reversão, pelo menos no curto prazo, dos déficits em conta corrente
dos EUA, que já duram mais de seis anos. Por outro, os Bancos Centrais
asiáticos, com suas enormes reservas de dólares, além dos recursos disponíveis
nos países exportadores de petróleo, têm mantido aquecida a demanda por títulos
do governo americano, o que mantém baixa a taxa de juros de longo prazo nos
EUA.
Outro aspecto que chama a
atenção é o pequeno impacto inflacionário nos países desenvolvidos. Esse
cenário contribui para reduzir a necessidade de aumentos mais acentuados na
taxa de juros de curto prazo para conter os índices de preços. Além disso,
comparativamente ao fluxo de petrodólares de momentos anteriores, o atual
representa uma maior sustentabilidade, uma vez que os recursos estão
pulverizados em diversos instrumentos derivativos de mercado e em vários
países, e não estão concentrados em apenas alguns intermediários financeiros
(bancos) e poucas economias. Por ora a economia internacional mantém o
equilíbrio financeiro. O crescimento continuado da China, e dos EUA, Japão e
Europa, mantém aquecida a demanda por exportações de diversos países. Se por um
lado há o aumento do preço do petróleo, por outro tem-se a evolução do preço de
diversas commodities exportadas por
países importadores de petróleo, o que ajuda a conter os déficits em conta
corrente. Com reservas maiores, há uma maior demanda por títulos seguros (EUA)
e também de emergentes. Com o menor risco, os juros nominais de longo prazo são
menores, o que contribui para manter o crescimento econômico e, com isso, o
ciclo se fecha. Mesmo assim, os riscos de ruptura desse ciclo ainda são
elevados.
Publicado no Informe Econômico/FIERGS
02/05/2006
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