domingo, 27 de julho de 2014

O PREÇO DO PETRÓLEO CONTRIBUI PARA FECHAR A EQUAÇÃO DO CRESCIMENTO MUNDIAL

Apesar do crescimento econômico sincronizado de diversos países no mundo nos últimos quatro anos, e a perspectiva positiva para 2006 (+ 4,9% de expansão do PIB), há riscos no cenário internacional que colocam em dúvida a continuidade desse processo. Em especial, destacam-se os desequilíbrios nas contas externas e a evolução do preço da energia. Um documento recente do FMI (World Economic Outlook) explora os impactos sobre a economia mundial de um aumento do preço do petróleo no mercado internacional, a partir de três questões fundamentais: o canal de transmissão de um choque de aumento do preço do petróleo; como os recursos financeiros obtidos pelos países exportadores do produto, os chamados petrodólares, tem impactado os mercados financeiros regionais; e, como as respostas de política macroeconômica podem afetar o comportamento da poupança e do investimento.
É importante ressaltar que o preço do petróleo ainda apresenta uma defasagem relativamente ao seu maior valor histórico, ocorrido no início da década de 1980, US$ 91/barril, em valores reais. Mesmo assim, o atual patamar tem implicações importantes do ponto de vista de equilíbrio na conta corrente entre os países, sobre os investimentos e também sobre a renda. No primeiro caso, parece claro que os maiores prejudicados devem ser os países importadores dessa commoditie, que devem experimentar uma deterioração na conta corrente, depreciação cambial, aumento dos juros internos e redução na demanda doméstica (PIB). No caso dos EUA, as estimativas são de que, no espaço de um ano, para cada US$ 10 de aumento permanente no preço do petróleo, haja uma redução de cerca de 0,5 ponto percentual no PIB conjugado com um aumento de 0,75 p.p. na inflação.
Por outro lado, os exportadores de petróleo podem se beneficiar desse cenário na medida em que aumentam as suas receitas de exportação em dólares. Nesse caso, o mais importante é separar os efeitos sobre a renda que são de caráter transitório daqueles permanentes. Na expectativa de uma modificação na renda que seja transitória, o aumento de receita desses países não deverá resultar em maior demanda por importações pois acreditam que logo o preço do produto irá recuar e, com isso, sua renda. Por outro lado, se a percepção dos produtores é de que a modificação na riqueza será permanente, então pode-se esperar uma modificação sobre as decisões de alocação entre consumo presente e futuro. Diferentemente do ocorrido nos dois outros choques do petróleo, 1973-74 e 1979-81, a atual evolução do preço não está concentrada em um curto espaço de tempo. Além disso, é cercada, de um lado pela expansão continuada do crescimento econômico da China e dos EUA, o que mantém a demanda pelo produto aquecida e, de outro, com a crescente tensão no mercado produtor, aumentam-se as incertezas sobre a manutenção da oferta do produto no curto prazo. Esses ingredientes, em conjunto, contribuem para aumentar a percepção de mudança permanente na renda por parte dos países exportadores de petróleo. Destaca-se que essa modificação na renda não é desprezível. Entre 1999 e 2005, o valor das reservas de petróleo dos países da OPEP aumentou para cerca de US$ 40 trilhões. Sendo assim, qualquer mudança na percepção de renda, por menor que seja, tem potencial de gerar um forte impacto sobre a demanda global.
O que se observa no cenário financeiro internacional no momento, é que os exportadores líquidos do produto estão poupando esses dólares, e os redirecionando para a compra de títulos de países emergentes e no financiamento dos déficits em conta corrente nos EUA. No primeiro caso, os resultados têm sido positivos com a redução risco-país. Entretanto, o segundo caso representa um financiamento com potencial risco para o equilíbrio financeiro internacional. De um lado, não há sinais de reversão, pelo menos no curto prazo, dos déficits em conta corrente dos EUA, que já duram mais de seis anos. Por outro, os Bancos Centrais asiáticos, com suas enormes reservas de dólares, além dos recursos disponíveis nos países exportadores de petróleo, têm mantido aquecida a demanda por títulos do governo americano, o que mantém baixa a taxa de juros de longo prazo nos EUA.
Outro aspecto que chama a atenção é o pequeno impacto inflacionário nos países desenvolvidos. Esse cenário contribui para reduzir a necessidade de aumentos mais acentuados na taxa de juros de curto prazo para conter os índices de preços. Além disso, comparativamente ao fluxo de petrodólares de momentos anteriores, o atual representa uma maior sustentabilidade, uma vez que os recursos estão pulverizados em diversos instrumentos derivativos de mercado e em vários países, e não estão concentrados em apenas alguns intermediários financeiros (bancos) e poucas economias. Por ora a economia internacional mantém o equilíbrio financeiro. O crescimento continuado da China, e dos EUA, Japão e Europa, mantém aquecida a demanda por exportações de diversos países. Se por um lado há o aumento do preço do petróleo, por outro tem-se a evolução do preço de diversas commodities exportadas por países importadores de petróleo, o que ajuda a conter os déficits em conta corrente. Com reservas maiores, há uma maior demanda por títulos seguros (EUA) e também de emergentes. Com o menor risco, os juros nominais de longo prazo são menores, o que contribui para manter o crescimento econômico e, com isso, o ciclo se fecha. Mesmo assim, os riscos de ruptura desse ciclo ainda são elevados.

Publicado no Informe Econômico/FIERGS 02/05/2006


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