Desde a crise asiática, no
final de 1997, ocorreu uma melhora significativa na performance macroeconômica
de vários países emergentes. Boa parte desse processo pode ser atribuída às
mudanças de política econômica, como por exemplo a adoção de uma taxa de câmbio
flutuante, a rigidez na política fiscal, a melhora na credibilidade no combate
à inflação, os ajustes na conta corrente e um acúmulo crescente de reservas.
Por outro lado, o atual ciclo de prosperidade econômica que o mundo passa, com
a elevada liquidez de capitais e o aumento do preço de diversas commodities internacionais, permitiu que
esses países encontrassem maiores facilidades nesse processo de ajuste.
Aproveitando
essa janela de mercado, vários emergentes, inclusive o Brasil, iniciaram um
processo de reestruturação de suas dívidas soberanas com o intuito de reduzirem
a exposição a diversos riscos de mercado. Como exemplo, cita-se o risco de taxa
de câmbio, com a redução da participação de títulos atrelados a moedas externas
no total da dívida (em especial na Tailândia, México, Venezuela e Hungria), a
menor exposição ao risco de taxa de juros, a partir da emissão de dívidas com
juros fixos e, por fim, a melhora do perfil de dívida com o aumento do prazo de
maturidade dos títulos que, na média dos emergentes, aumentou de oito anos em
2001 para 13 anos em 2005.
Outra
estratégia importante nesse cenário foi a recompra de dívidas externas, que
reduziu o valor de face dos Brady Bonds
de US$ 150 bilhões (ao final de 1996), para cerca de US$ 10 bilhões em 2006.
Além disso, Brasil, Colômbia, Turquia e até a Venezuela, anunciaram programas
de recompra de dívida de curto-prazo e atrelada a moedas externas. Essas
medidas seriam cumpridas ao longo desse ano. Por fim, tem-se o processo de
emissão de dívida externa denominada em moeda local, como feito pela Colômbia
em 2004 e 2005, e pelo Brasil, no ano passado.
Apesar do
cenário benigno no mercado financeiro internacional, nem todas as notícias são
positivas. Há um grupo de países emergentes que apresentam uma deterioração no
processo de administração de suas dívidas, como a Argentina, a República
Dominicana e o Uruguai e que, com isso, estão mais vulneráveis frente aos
demais. A radiografia econômica desse cenário revela que o aspecto comum nesses
países tem sido a combinação de uma política fiscal mais “frouxa”, com dívidas
elevadas, déficit em conta corrente e a excessiva dependência de uma
continuação dos preços elevados de algumas commodities.
Mesmo assim,
o resultado do ajuste pode ser visualizado na classificação de risco atribuída
pelas agências internacionais. Dentre todos os emergentes, o Chile, juntamente
com a Coréia, são os que apresentam o melhor rating, “A”, de acordo com a Standard & Poor’s. China, Malásia,
República Checa e Hungria, possuem classificação um pouco inferior, “A-“. O
terceiro grupo é composto por Tailândia, Polônia e África do Sul com “BBB+”.
Destaca-se que a classificação do Brasil ainda está baixa relativamente a esses
países, “BB-“. A Venezuela, o país nesse grupo com a menor classificação, tem
nota “B+”.
No conjunto,
os países emergentes apresentam um cenário mais benigno para o investidor, seja
ele interno ou então no mercado externo, comparativamente a outros períodos. É
importante ressaltar que no ano de 2006 ainda deve ocorrer diversas eleições na
América Latina, o que poderia resultar no que se denomina de efeito contágio da
política sobre a economia. Porém, como forma de reduzir esse risco entre os
países, os governos locais já anunciaram planos de pré-financiamento das
dívidas que vencem em 2006. Destaque para Colômbia e México, que praticamente
já captaram o total de recursos necessários para fazer frente às necessidades
do ano, enquanto que para o Brasil ainda faltam cerca de US$ 1 bilhão.
Apesar do
sucesso em reduzir a exposição ao risco nos últimos anos, é importante
ressaltar que o cenário de elevada liquidez internacional não deverá perdurar
por muito tempo, em especial diante de uma constante elevação do preço do
petróleo no mercado internacional. Nesse caso, é muito importante que a
combinação de uma política fiscal forte e de taxas de câmbio flutuante,
concomitantemente ao processo de maior autonomia dos bancos centrais, tenha
continuidade nos emergentes.
Os
investidores internacionais estão atentos aos desafios que cada país terá que
enfrentar para continuar a se beneficiarem desse cenário. Desenvolver um
mercado de ações e, principalmente de derivativos, que permita aos investidores
se protegerem de riscos; estimular os investidores institucionais internos
(fundos de pensão) a participarem da composição de dívida; reduzir tributação e
melhorar a legislação e supervisão do mercado. Apesar de alguns críticos
imaginarem tais recomendações como parte de uma grande teoria da conspiração
isso apenas se configura como uma receita de melhoria da relação entre os
agentes e, portanto, da própria eficiência econômica.
Publicado no Informe Econômico/FIERGS
24/04/2006
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