terça-feira, 29 de julho de 2014

INTEGRAÇÃO FINANCEIRA: VAMOS OU NÃO ENTRAR NESSA BRIGA?

Os últimos quinze anos foram marcados por profundos processos de mudanças institucionais em todos os países. Vários esforços em aumentar o grau de integração comercial entre as diferentes regiões foram verificados nesse período, e o desenvolvimento da tecnologia da comunicação e a adoção de regras mais claras sobre contratos, permitiu uma maior integração financeira entre países emergentes e desenvolvidos. Apesar de ainda ser necessário percorrer um longo caminho, podemos dizer que a América Latina, a Ásia e os países do Leste Europeu passaram a ocupar lugar de destaque na conjuntura internacional.
Porém, da mesma forma que a integração econômica e financeira traz benefícios, ela também produz alguns custos. Para entender essa contabilidade, uma forma clara de expor seus resultados é dividir o processo de integração entre regional e global. No primeiro caso, dizemos que há uma maior relação entre o país e os demais localizados na própria região. Por outro lado, a integração global deve ser entendida como um processo de maior relação com outros países em todas as regiões. Recente estudo do BIS(2007) – Bank for International Settlements, mostra que o processo de integração econômica e financeira na América Latina contribuiu nos últimos anos para facilitar a diversificação dos riscos por parte dos investidores internacionais. Ou seja, investir na região contribuiu para agregar valor na medida em que reduziu os riscos sistêmicos, uma vez que o mercado financeiro internacional ainda analisa a região como um todo. Esse resultado se mostrou melhor que os encontrados para a Ásia e o Leste Europeu. Um dos motivos que podem ser apontados, nesse caso, é que essas regiões ainda não possuem um mercado de títulos tão desenvolvido como na América Latina e, portanto, não atraem recursos com essa finalidade na mesma proporção.

Por outro lado, é possível notar que existe um maior “regionalismo” no investimento na Ásia. Ou seja, a poupança da região é investida mais em títulos de países da própria região. Em especial, investidores de Cingapura e Hong-Kong, dois importantes centros financeiros locais, procuram investir em títulos de governos ou empresas localizadas na região. O mesmo não se verifica em tamanha intensidade na América Latina, com poucos investidores na Argentina, por exemplo, aportando recursos no Brasil, Chile ou México. Um resultado interessante, e que pode sinalizar que os investidores da região se comportam de maneira conservadora quando se trata de aportar recursos nos países vizinhos.
Outro resultado que chama a atenção é que os países do Leste Europeu têm se beneficiado proporcionalmente mais do fluxo de capitais proveniente das economias desenvolvidas da União Européia, do que os emergentes da Ásia com o Japão, ou os emergentes da América Latina com os EUA e Canadá. Esses resultados indicam que os países do Leste Europeu estão se integrando de forma mais rápida com outros emergentes e também com outros países desenvolvidos do que a América Latina. A considerar a disponibilidade de capitais na América do Norte, podemos conjecturar a ineficiência da região em capitalizar a proximidade com esse mercado - um resultado tipicamente relacionado com as amarras ideológicas que continuam a impedir nosso desenvolvimento.
Outro fato importante é que em um cenário de maior integração financeira mundial, o crescimento econômico de um país passa a depender menos da taxa de poupança interna. Como a poupança externa passa a ser elemento determinante na composição do investimento, o que irá diferenciar a capacidade de absorção desses recursos entre os países é o grau de transparência e respeito a contratos prevalecentes nas instituições nacionais. Assim, será exigido, cada vez mais, dos governantes locais a adoção de regras mais críveis e menos desvios de conduta, como a prática de corrupção. Essa sinalização positiva recebe como prêmio o aporte de capitais que não são de curto prazo, e sim para investimentos em infra-estrutura, participação acionária em empresas ou então na construção de novas unidades produtivas, constituindo um foco no longo prazo. Da mesma forma, seremos punidos se não seguimos as “regras desse jogo”. Destaca-se que a maior integração econômica e financeira facilita a diversificação de investimentos, reduzindo os impactos dos riscos associados a choques macroeconômicos de um único país, ou então ativo. Em outros momentos da história econômica mundial, a atual crise do mercado subprime nos EUA teria impactos muito mais amplos sobre outras economias e ativos se o grau de integração econômica e comercial ainda fosse reduzido.
A integração financeira deve continuar a se intensificar nos próximos anos, e cada vez mais países em todos os continentes vão lutar para ter acesso a esses recursos de longo prazo. O Brasil deve decidir se entrará nessa disputa, ou ficará como expectador. Se a escolha for entrar na briga, devemos aprofundar as reformas institucionais e permitir que o setor privado continue a ganhar em produtividade, para ter condições de concorrer no cenário nacional e internacional. Caso contrário, iremos depender da geração de poupança interna para financiar nosso crescimento. Nesse caso, o governo deve controlar gastos para permitir a queda mais rápida dos juros e, com isso, deixar de “abocanhar” grande parcela da poupança, abrindo espaço para o investimento privado. Como pode ser visto, qualquer que seja a escolha, necessariamente passa-se por ações políticas, e aí reside o maior dos problemas.


Publicado no Informe Econômico/FIERGS 17/09/2007

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