Apesar do
alerta em tempos passados e das constantes publicações acerca da necessidade de
um ajuste nas finanças públicas do Estado do Rio Grande do Sul, todos os
governos passados em pouco, ou quase nada, contribuíram para a resolução
estrutural de dois problemas crônicos: uma despesa acima das receitas e uma má
alocação dos recursos arrecadados com impostos e contribuições.
Durante anos,
a inflação elevada ajudou tanto a União quanto os Estados brasileiros no ajuste
financeiro de suas despesas. Porém, com o fim desse arranjo perverso que
deteriorava o poder de compra da parcela da população que não podia se proteger
de maneira adequada, os governos local e nacional se viram diante de um grande
problema a resolver: como equilibrar receitas com despesas.
Infelizmente,
essa visão empresarial de gerência não se encontra enraizada na maioria dos
gestores no Brasil em todas as esferas de administração pública. No caso do Rio
Grande do Sul, na ausência do benefício inflacionário, os sucessivos governos
lançaram mão de diversos instrumentos para fazer frente a esse desequilíbrio,
como por exemplo, as privatizações e concessões, o uso de instrumentos
contábeis como o caixa único e também a elevação de impostos. Para complementar
a má gestão dos ativos e passivos públicos, a partir do plano Real verifica-se
um processo de sucessivos equívocos administrativos e políticos, como por
exemplo: os constantes reajustes de salários muito acima da inflação, a
manutenção e, em alguns caso, até a ampliação de privilégios previdenciários
não condizentes com as melhores práticas atuariais, a má alocação de recursos
em programas populistas e a manutenção de empresas públicas ineficientes e
deficitárias. Esses fatores, em conjunto ou isolados, colocaram diversos
estados da federação em rota de colisão com o aumento da demanda por bens
públicos por parte da sociedade.
Aos poucos,
foi possível notar o processo de falência nessa relação entre a sociedade e os
governos que se manifestou de diversas maneiras, como o aumento da violência, a
piora nos serviços de saúde e a deterioração dos ativos públicos como rodovias,
ferrovias, hidrovias, aeroportos, infra-estrutura urbana e prédios públicos.
Algumas tentativas de corrigir esses desequilíbrios foram feitas com o intuito
de dar mais dinamismo ao Estado, como as concessões e privatizações, mas
infelizmente esbarraram tanto na barreira ideológica quanto na ausência de um
planejamento que pudesse definir regras claras nesse processo, o que acabou por
suscitar questionamentos sobre a eficiência de tais mecanismos de relação entre
setor público e privado. Vale ressaltar que tais motivos também foram
responsáveis pela dificuldade em implementar as PPP (Parcerias Públicos
Privadas), projeto que vai ao encontro de um arranjo mais dinâmico do processo
de oferta de bens públicos. Destaca-se que tal cenário de deterioração
aplica-se não apenas na esfera federal, mas também em estados e municípios,
mesmo que em uns de forma mais abrupta e intensa que outros, mas visível diante
de um crescimento populacional e da manutenção do processo de urbanização no
país.
Atualmente, os
problemas gaúchos são uma fotografia reduzida das questões nacionais sem
prejuízo de sua significância porém, com o agravante de que não se pode contar
com os recursos de maquiagem que a liberdade de política monetária permite à
União. Além disso, esse quadro tem se agravado ano após ano, na medida em que
os governos postergam a passagem do discurso para a ação. O debate sobre o
ajuste estrutural do Estado está na pauta das principais instituições de classe
da sociedade gaúcha e, a entrada de um novo ciclo político é a oportunidade
para que as vozes dos eleitores sejam ouvidas e que seja possível criar um Rio
Grande mais moderno, e que seja para todos.
Nos próximos informes econômicos, estaremos abordando os
principais temas de reforma do Estado a partir de uma perspectiva de finanças
públicas. Serão considerados aspectos como a reforma do sistema previdenciário
e suas implicações para a economia gaúcha: como seria possível eliminar
privilégios no setor público e permitir uma adaptação dos gastos do Estado às
suas receitas. Além disso será discutido o papel do Estado na promoção do
desenvolvimento econômico e a questão do incentivo às exportações, dentre
outros temas. É importante salientar que, apesar do conhecimento de todos essas
questões por parte da sociedade e também da convergência em diversas soluções
apontadas, parece claro que o mais urgente passa a ser a definição de uma
agenda para a implantação de tais propostas. Uma fotografia do Rio Grande de
2006 revela sinais de um Estado que, por vários anos, abriu mão de aplicar um
projeto de longo prazo, restringido-se apenas a planos de 4 anos e focado
apenas no fluxo de caixa. A mudança na forma de pensar essas questões passa
necessariamente pela convergência de idéias em torno de melhores práticas de
governança pública. Nesse sentido, devemos ter em mente que, da mesma forma que
esse cenário não foi construído por apenas um partido ou governo, os resultados
também não deverão ter apenas um agente responsável. Para haver resultados de
longo prazo é necessário o comprometimento de vários governos e da sociedade
civil com um projeto de longo prazo.
Publicado no Informe Econômico/FIERGS
26/06/2006
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