O cenário conjuntural do
primeiro trimestre desse ano parece reservar algumas surpresas negativas para a
economia gaúcha que, apesar de ainda não terem se manifestado em todos os
indicadores de desempenho, sinalizam para a necessidade de revisão de perspectivas.
Em especial citam-se quatro fatores: a gripe aviária, a febre aftosa, a queda
no preço de importantes commodities
agrícolas para o RS e a estiagem desse primeiro trimestre.
Mesmo sem registro de caso
de contaminação pela gripe aviária em toda a América até o momento, o setor no
Brasil já sente os impactos econômicos da retração na demanda em diversos
países. Apesar dos esclarecimentos feitos a respeito da baixa probabilidade da
entrada do vírus no continente, as exportações brasileiras de carne de frango
diminuíram, e o medo com a contaminação vem mudando os hábitos de consumo
também no mercado interno.
Vale lembrar que, em um
primeiro momento, os focos que foram identificados no continente Asiático
abriram a possibilidade de efeito substituição de fornecedores mundiais a favor
do Brasil. Porém a atual redução do consumo do produto, mesmo que temporária,
pode vir a anular esses ganhos. A média de consumo de carne de frango no mundo
é de cerca de 11 kg
per capita, com Hong Kong e os EUA consumindo cerca de 50 kg e 42 kg respectivamente. No
Brasil, a estimativa é de 34
kg per capita, sendo o país o terceiro maior produtor
mundial, participando com cerca de 15% do total, e o maior exportador do
produto.
O excessivo alarde dos
riscos feito nos últimos meses pode gerar uma externalidade positiva, qual
seja, investimentos no controle e na prevenção que venham a limitar a expansão
do vírus. O governo dos EUA, por exemplo, encaminhou em dezembro do ano passado
ao Congresso pedido de verba no valor de US$ 7 bilhões para investir em
pesquisa e prevenção do vírus H5N1 (vírus da gripe aviária), já tendo sido
liberados US$ 3,8 bilhões. Essa ação pode resultar em ganhos para o Brasil no
médio e longo prazo, na medida em que a população for melhor esclarecida sobre
os reais impactos.
Nesse sentido é que se
trabalha com reflexos econômicos negativos apenas no curto prazo, como forma de
se adaptar a oferta do produto a essa rápida redução na demanda, projetando-se
no médio e longo prazo uma volta à normalidade nesse mercado. No Brasil, os
estados que tem maior importância tanto na produção, emprego e exportações de
carne de frango e, devem ser as economias que mais sentirão esses impactos
negativos são Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
No caso do setor no Rio Grande
do Sul, uma redução entre 4% e 8% das vendas no mercado interno (já computada a
queda nos preços) conjugado com uma retração das exportações entre 10% e 15%,
pode representar uma queda de cerca de 2,8 mil a 4,4 mil empregos no estado
(diretos, indiretos e efeito-renda). Isso deverá prejudicar o desempenho da
indústria de produtos alimentares e também a sua cadeia produtiva.
Outro aspecto conjuntural
que já afeta negativamente o agronegócio no estado é a queda no preço do arroz
(cerca de 32% em 12 meses), soja (-28%) e milho (-29%). O mais importante a
destacar nesse cenário é o baixo retorno que o setor deverá ter nesse ano e que
deverá se reproduzir em toda a cadeia, incluindo indústria e serviços, com
reflexos para os próximos anos. É importante lembrar que movimentos cíclicos na
produção são naturais em diversas economias e diferentes segmentos, em especial
na agricultura onde são mais pronunciados. Porém, quando esse processo é
interrompido de forma abrupta, como foi o caso da intensa seca do ano passado,
é necessário que se crie as condições para a retomada da normalidade produtiva,
sob pena de a recuperação da atividade econômica levar muito mais tempo para se
recuperar do que deveria em um cenário de ausência de choques.
É com essa perspectiva que a
queda do preço das commodities,
aliada a uma nova seca, mesmo que em menor intensidade nesse ano, deverá
resultar em prejuízos para toda a economia do estado. Além disso, deve-se
verificar uma redução da renda relativa do produtor principalmente na região
noroeste e sudoeste do estado, onde a soja e o arroz, respectivamente, são
determinantes para a produção agrícola, impactos no emprego, nas vendas do
comércio e na arrecadação de ICMS.
Por fim há que se considerar
os impactos da febre aftosa. Como se sabe há dois focos declarados da doença no
país, até o momento: Paraná e Mato Grosso do Sul. Apesar do Rio Grande do Sul
ser considerada uma zona livre, não se pode negar os impactos negativos que o
setor pode ter no cenário internacional, uma vez que, inicialmente os embargos
são processados ao país, e não para uma determinada região. Nesse caso, cabe às
autoridades locais o esforço em esclarecer ao mercado que determinada região
estaria livre da doença e que, portanto, as exportações podem continuar sem risco.
Como pode ser visto, assim
como no ano passado, 2006 parece reservar surpresas conjunturais desagradáveis
para a economia do estado, e que deve restringir a capacidade de investimento
do agronegócio gaúcho.
Publicado no Informe
Econômico/FIERGS 20/03/2006
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