segunda-feira, 28 de julho de 2014

A REFORMA DA PREVIDÊNCIA NO JAPÃO

A teoria econômica de longa data preconiza os impactos positivos que elevados níveis de poupança produzem sobre o crescimento de longo prazo. É claro que essa não é a única variável a determinar esse cenário, mas, sem dúvida alguma, a disponibilidade de recursos para o investimento reduz seu custo, e contribui para o aumento da produtividade.
Os países desenvolvidos há bastante tempo procuram nos fundos de pensão uma alternativa viável para a formação da poupança de longo prazo. Nesse cenário mundial, destaque para os fundos de pensão dos EUA e o Japão, que juntos representam pouco mais de 76% dos ativos dos 50 maiores fundos de pensão do mundo. O Japão possui o maior deles, o Government Pension Investiment Fund (GPIF), um fundo de pensão nacional gerido pelo governo e que tem ativos de US$ 1,6 trilhão. Destaca-se que esse fundo é apenas um dos três pilares do modelo de previdência do país, e se aplica a funcionários públicos, do setor privado (tal como o INSS no Brasil), e também para trabalhadores empregados por conta própria, que fazem as suas contribuições voluntárias. É importante ressaltar que cerca de 108 milhões de pessoas participam desse fundo de pensão.

O segundo grande pilar desse modelo são os fundos de pensão corporativos, que representam cerca de US$ 1 trilhão de ativos, e com aproximadamente 16 milhões de participantes. Por fim, tem-se o terceiro pilar do sistema de previdência no Japão, que são os planos individuais, onde participam cerca de 15 milhões de pessoas. Porém, esse sistema representa uma parcela pequena do total de ativos. Um dos motivos é o fato de que os trabalhadores já possuem um dos outros dois planos, recorrendo às contribuições individuais apenas para complementar sua aposentadoria.
As reformas do sistema previdenciário japonês iniciaram-se em 1997, e devem durar até 2009. Uma das medidas adotadas foi a permissão para que as empresas passassem a conceder, além dos planos de benefício definido, os também chamados planos de contribuição definida, que são focados em um processo de capitalização. Como esse modelo é mais apropriado do ponto de vista de equilíbrio do sistema, era natural esperar uma migração de um modelo para outro, e é justamente isso que se tem notado nos dados do setor.
Como pode ser visto, o modelo de previdência japonês guarda algumas similaridades com o modelo existente no Brasil. Tal como lá, aqui o sistema previdenciário também se apóia em um pilar, o INSS. Porém, há diferenças fundamentais e que acabam por resultar em desequilíbrios no Brasil. Aqui, não estão claramente definidas as regras para o modelo de previdência do setor público, altamente deficitário em todas as esferas (federal, estadual e municipal). Além disso, os reajustes de benefícios no Brasil estão indexados ao valor do salário mínimo, ao contrário do modelo japonês. Da mesma forma que no Japão, no Brasil também temos os planos de previdência privados fechados, ou seja, os corporativos. E, por fim, o pilar da poupança individual, com a presença dos chamados PGBL e VGBL, que vêm para complementar a aposentadoria do trabalhador.
Apesar da similaridade, enquanto as reformas do modelo de previdência no Brasil patinam, em especial a relacionada ao setor público e o INSS, e serão feitas sob um cenário de caos no sistema, com déficits elevados, o Japão se antecipou a esses problemas. Na medida em que aumentava a expectativa de vida e reduzia-se a taxa de natalidade no Japão, as projeções atuariais indicavam dificuldades para os fundos de pensão em um horizonte de 20 anos. Para complicar ainda mais, o país passou por um cenário adverso entre os anos de 2000 a 2002, com queda da rentabilidade no mercado acionário e retorno menor na renda fixa. Em conjunto, esses dois movimentos desequilibraram a relação entre ativos e passivos dos fundos e incentivou o governo a implementar uma série de reformas.
Essa reforma focou dois pontos: a avaliação dos ativos e passivos de acordo com as taxas de mercado (marcação a mercado dos títulos) e a regulamentação da alocação dos investimentos de tal forma a criar uma espécie de segurança para o capital dos fundos. Vale destacar que essa medida deverá modificar, em especial, a alocação de ativos do GPIF, e deve ser implementada até 2009. De uma forma geral, as diretrizes são de que 67% de seus investimentos sejam feitos em títulos do governo japonês, 11% em ações do mercado japonês e 8% em títulos estrangeiros, respeitando alguns critérios de desvios desses limites. Com essas regras, abre-se a possibilidade de que o GPIF faça investimentos em títulos estrangeiros da ordem de US$ 52 bilhões nos próximos anos. Por outro lado, para que os fundos de pensões corporativos se adaptem a essa nova regra, terão que se desfazer de cerca de US$ 13 bilhões aplicados em títulos estrangeiros até 2009. 
Após dez anos de implementação das primeiras reformas no sistema previdenciário no Japão, o país abre caminho para uma nova trajetória de crescimento sustentado. É claro que somente um sistema previdenciário equilibrado não será condição suficiente para tal, mas já se constitui em condição necessária, especialmente em países com baixa taxa de poupança como é o caso do Brasil. Quanto mais cedo pudermos resolver essa equação, mais rápido poderemos também trilhar essa trajetória.


Publicado no Informe Econômico/FIERGS 08/01/2007

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