terça-feira, 29 de julho de 2014

A MENSAGEM QUE VEM DO MERCADO FINANCEIRO

Bastaram dois dias de turbulências no mercado acionário mundial para que os sinais de vida do risco se fizessem sentir. A divulgação, por parte do FMI, de revisão para cima do crescimento econômico mundial no biênio 2007 e 2008, foi negligenciada pelos resultados da venda de residências nos EUA, que apresentaram uma queda mais significativa que a esperada por analistas. O efeito dominó sobre outros ativos como ações e fundos de investimento foi inevitável, em um mercado financeiro cada vez mais integrado. E os impactos foram sentidos também em outros países, em especial nos emergentes.
Demorou algumas horas para se perceber que o barulho era muito maior do que o necessário, a exemplo do movimento de venda que se verificou no início do ano nas bolsas da Ásia. E logo os investidores fizeram correções. A própria divulgação na sexta-feira dos resultados do segundo trimestre do PIB dos EUA, com crescimento anual de 3,4%, e que veio acima do esperado por analistas, contribuiu para mostrar que os riscos de rompimento do atual cenário de crescimento mundial são baixos. Nessa análise, há um fator importante a destacar e que diferencia o atual ciclo dos ocorridos no passado, o crescimento coordenado entre as nações. Nesse caso, a perspectiva de que a economia americana irá crescer menos, é contra-balanceada pelas projeções feitas para a Ásia, América Latina e Europa.
Em todo caso, o cenário voltou à normalidade em seguida, com as ações iniciando um processo de reversão em diversas bolsas de valores. O risco-país recuou no Brasil e o real valorizou frente ao dólar.  Além disso, investidores prestaram mais atenção nas projeções do FMI, que sinalizam demanda aquecida por bens, serviços e ativos de países emergentes. Mantidas as projeções de exportações totais de US$ 17 trilhões no ano de 2007, o Brasil é forte candidato a continuar a se beneficiar desse cenário.
Porém, devemos tirar algumas lições do ocorrido. Entre 2004 e o início desse ano, os fatores de risco eram bastante conhecidos pelos investidores: o conflito político no Oriente Médio, as tensões promovidas pelo Irã, Coréia do Sul e Venezuela, e a evolução do preço do petróleo. Além disso, as notícias da existência de risco de bolha no mercado imobiliário americano já eram alardeados. Mas, até então, esses fatores em pouco influenciavam o chamado “humor” do mercado, que atravessou quase 36 meses de relativa estabilidade global, com valorização contínua dos diversos ativos. O evento da semana passada já foi o terceiro repique mundial em menos de quatro meses. Parecem gritos isolados na imensidão de prosperidade econômica, mas mesmo assim causam uma sensação estranha de que algo está por vir. Não que se deseje que ocorra o pior, mas é sempre bom testar os cenários de stress, para vermos onde se encontram as falhas, e procurar evitar o pior.
Sabe-se que a pimenta no menu dos mercados financeiros é a incerteza. Na presença dessa, há volatilidade e prêmio de risco, o que potencializa os lucros. Pode parecer estranho para nós, que estamos no lado real da economia, desejando estabilidade nos ativos para fazer planejamentos de médio e longo prazo. Mas, para investidores em ativos de risco, essa é uma variável determinante. O cenário atual mostra-se enfadonho, morno, sem novidades, poucos riscos e muito previsível para quem atua no mercado financeiro. Até o petróleo perdeu espaço nas discussões. Parece que a economia se adaptou a uma situação de preço médio maior. Ou então os investidores vêem menores riscos nesse mercado devido a alternativa de entrada de um concorrente capaz de limitar os impactos dessa commodity, como é o caso do biocombustível. Mas, os livros e a prática ensinam que se a oscilação nos preços dos ativos é menor, os ganhos potenciais com derivativos ficam reduzidos. Se o investidor quer mais retorno, deve aceitar correr mais riscos. Mas onde há mais risco, se até os emergentes apresentam estabilidade? Tem havido uma espécie de “garimpo” por risco por parte de investidores. Parece que há uma vigília sobre o momento exato do rompimento das estruturas financeiras montadas ao redor do mundo. Mas, mesmo assim, nada parece abalar a confiança dos consumidores nos EUA, na Europa e Ásia.
Dessa forma, diante do ocorrido, nos perguntamos se realmente existem riscos potenciais, ou apenas especulação com o objetivo de promover um pouco mais de incerteza. Será nostalgia dos tempos em que as notícias de economia realmente chamavam a atenção, ou há algo de errado nesse cenário? Com uma boa dose de risco de errar, afirmamos que os riscos de crise coordenada são baixos. Os fundamentos das economias não mudaram no último mês, e a safra de balanços trimestrais irá mostrar lucros altos o suficiente para dar suporte a novos investimentos em expansão da produção.
Apesar dos riscos baixos, prefiro fazer uma leitura esotérica do ocorrido, interpretando os movimentos dos ativos no Brasil, como um sinal de que continuamos vulneráveis a ventos fortes. A justificativa de que investidores procuraram um “porto seguro” para os ativos, retornando para os títulos americanos, é aceitável, mas não explica sozinho porque os ativos no Brasil oscilaram mais que os ativos nos demais países. Onde estão as reformas para nos proteger do pior?


Publicado no Informe Econômico/FIERGS 30/07/2007

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