domingo, 10 de agosto de 2014

Muito além

O debate sobre política industrial envolve a
compreensão de diversos temas que se interrelacionam,
formando uma teia de diferentes ações.
Na primeira parte desse informe, ficaram evidentes
as discrepâncias da produção da indústria nas
regiões do Brasil, com alguns estados concentrando
determinados tipos de atividades. Porém, esse ponto
não pode ser considerado de forma isolada. Há
questões importantes como, por exemplo, a visão de
cadeia produtiva, os aspectos de competitividade, as
regras de tributação sobre a produção e a influência
do setor externo sobre o perfil de produção da
indústria local.

Além disso, uma política com visão de
longo prazo deve ter em mente que há
transformações sociais e econômicas em curso e que
podem atuar sobre a indústria no futuro. Nesse caso,
destaque para as ações de política industrial utilizada
em outros países, como nos EUA, para incentivar a
pesquisa e o desenvolvimento de energia limpa e
renovável. Um campo amplo e que pode resultar em
benefícios para toda a sociedade, seja com garantia
de fornecimento de energia para consumidores e
produtores a preços mais competitivos ou gerando
impactos positivos sobre o meio ambiente. Além, é
claro, de ser uma variável estratégica do ponto de
vista de domínio da tecnologia.
Outra transformação em curso é o próprio
envelhecimento da população brasileira projetado
para os próximos anos. Com mais pessoas em idade
acima de 65 anos, é natural esperar uma maior
demanda por diferentes tipos de produtos industriais,
em especial aqueles voltados à saúde, também uma
grande portadora de tecnologia. Nesse caso,
devemos preparar a chamada “economia da saúde”
para ser competitiva em seus vários ramos de
influência, que vão desde os serviços médicos e de
seguro até a produção de equipamentos sofisticados
e o desenvolvimento de vacinas e também de
produtos farmacêuticos.
Outro ponto de destaque é a visão de cadeia
produtiva. Por exemplo, não há como pensar em
criar um ambiente propício para a produção de leite
e derivados sem se preocupar com os diversos
problemas que atingem os produtores primários, que
vão desde o controle fitossanitário até os acordos
comerciais. Da mesma forma, não há como pensar o
agronegócio, importante segmento gerador de
riqueza no Brasil, sem caracterizar os diversos elos
de produção da agroindústria e as distorções
causadas pela tributação entre os estados na
industrialização de produtos tão essenciais para a
sociedade. Nessa discussão de cadeia produtiva os
exemplos são vários. Reduzir tributos incidentes sobre
a produção de tratores gera competitividade local para
as indústrias produtoras e, ao mesmo tempo, também
permite que a agroindústria, em várias regiões, se
beneficie, aumentando a eficiência produtiva nacional
e resultando em menores preços a consumidores. Por
fim, não há como a política industrial ser eficiente se
não forem resolvidos os problemas que atingem o
item “distribuição”, e que envolve investimentos em
infraestrutura logística, ainda tão carente e que perdeu
espaço para o tema “copa do mundo” e “olimpíadas”.
Outro tema que deve nortear as discussões é a
importância do setor externo, negligenciado nos
últimos anos pelo governo federal e também pelos
estados. Recentemente, o que se nota é uma constante
perda de competitividade dos produtos manufaturados
brasileiros no exterior. As exportações da indústria,
quando medida em reais, foram de R$ 319 bilhões em
2004 e, no ano passado, R$ 242 bilhões. Há uma série
de fatores que ajudam a explicar esse desempenho,
como por exemplo: (i) uma taxa de câmbio valorizada
– atua no sentido de tornar mais cara a produção
interna relativamente à observada em outros países;
(ii) o não cumprimento de contratos por parte do setor
público com o pagamento de créditos tributários
represados, seja em nível federal ou estadual – implica
em incertezas tributárias e aumento dos custos de
produção; (iii) a burocracia aduaneira – dificulta a
dinâmica para exportadores; (iv) a ineficiência
estrutural na logística – representa um custo adicional.
Essa abordagem é importante para o Brasil
devido ao fato de as receitas com exportações
representarem 14% do faturamento total da indústria.
Para o Rio Grande do Sul, onde esse percentual é de
19%, o maior dentre principais estados exportadores,
a relevância do tema é ainda maior. Em toda essa
discussão, impressiona a dificuldade em convencer as
autoridades públicas da importância das exportações
para o desenvolvimento de um país. Não é por nada
que, no grupo dos 10 maiores exportadores mundiais
estão nada menos que 9 países desenvolvidos.
Somente a China, como país emergente, figura nesse
grupo. O governo desses países sabe dos benefícios de
explorar um mercado de sete bilhões de pessoas.
Ao criar a oportunidade de discutir a política
industrial, os agentes envolvidos devem compreender
a importância desse setor para a geração de riqueza.
Destaca-se que, na história econômica mundial, não
há um caso de sucesso de um país que tenha se
desenvolvido abrindo mão de uma indústria forte.
Para tanto, se quisermos figurar nesse grupo, a política
industrial deve ser maior que um governo, e ter visão
de longo prazo.

Publicado no Informe Econômico 01/agosto/2011

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