domingo, 10 de agosto de 2014

Jogaram areia no ventilador

Apesar do envoltório político sobre a
aprovação do último acordo de ampliação do limite
de dívida dos EUA, o ponto principal a ser
destacado, e que veio à tona na última semana, foi a
dificuldade da economia americana em se recuperar
no curto prazo. Desde o agravamento da crise
financeira, em outubro de 2008, já foram feitos
quatro outros aumentos do limite de endividamento,
totalizando US$ 4,4 trilhões. O acordo fechado na
semana passada é o 5º em um espaço de três anos, e
também o de maior volume da história e que mais
carrega a exigência de contrapartidas.

Desde a criação do limite estatutário da lei
federal, em 1917, uma sequência de pedidos como
essa somente foi presenciada em momentos atípicos,
como por exemplo, para fazer frente a maiores
gastos de guerra, ou então, para o enfrentamento de
um cenário de recessão. Nesse caso, destaque para
os nove aumentos consecutivos entre 1972 e 1975,
na esteira do 1º choque do petróleo e que produziu
uma recessão de 16 meses no país. Naquele
momento, o limite de dívida passou de US$ 450
bilhões para US$ 595 bilhões.
A economia americana entraria em uma
nova recessão entre 1980 e 1982, novamente
pressionando o governo com os gastos públicos.
Entre maio de 1980 e setembro de 1982, o limite de
dívida foi revisto nove vezes, passando de US$ 879
bilhões para US$ 1,29 trilhão. No ano seguinte, o
governo perceberia que ainda seria necessário
continuar a estimular a economia, e o limite foi
revisto mais duas vezes, passando o mesmo para
US$ 1,49 trilhão ao final de 1983.
Uma nova recessão, entre julho de 1990 e
março de 1991, demandaria mais sete aumentos.
Porém, com uma diferença, desta vez o mesmo foi
feito a “conta-gotas”, gerando um desgaste político
para o presidente George Bush. A primeira
autorização do Congresso elevou o limite de dívida
de US$ 3,12 trilhões em 9 de agosto para apenas
US$ 3,19 trilhões e que duraria somente até 02 de
outubro. Depois dessa data, caso fosse necessário o
governo deveria voltar ao Congresso. E foi o que
aconteceu mais quatro vezes, sempre com a mesma
prática, autorizando para um curto espaço de tempo.
Somente em 05 de novembro de 1990, diante de
uma recessão que não dava trégua, é que o
Congresso aprovou um limite maior para a dívida,
elevando o mesmo para US$ 4,1 trilhões.
A última recessão americana, que ocorreu
em 2001, foi branda e, mesmo diante do aumento do
gasto público, não foi necessário ao governo recorrer
a um pedido de aumento do limite de
endividamento. A economia recém havia saído de
um período de quatro anos seguidos de receitas
maiores que despesas, que resultou na redução da
dívida. Ou seja, havia folga de caixa.
No cenário de hoje, todo o problema do
último acordo já havia sido anunciado pelo Secretário
do Tesouro dos EUA no dia 16 de maio, quando
declarou que o Governo já tinha atingido o limite de
dívida de US$ 14,2 trilhões. Só que, a aprovação do
aumento do limite não era urgente, pois ainda existia
um recurso extraordinário de caixa da ordem de US$
232 bilhões, que seria suficiente para garantir os
pagamentos até o dia 02 de agosto. A partir desse dia,
estendendo-se por todo o mês, haveria a necessidade
de pagamento de US$ 306 bilhões contra uma
expectativa de arrecadação de US$ 172 bilhões.
A necessidade de uma forte mobilização
política alertou os mercados, que passaram a
acompanhar a negociação com atenção. O que até
então seria apenas um problema político e, diga-se de
passagem, corriqueiro (foi mais de uma centena de
vezes que se aumentou o limite na história), se
transformou, de fato, em um problema econômico. E
o motivo é simples, reduziram a possibilidade de
novos estímulos fiscais para reaquecer a economia. O
último acordo envolveu uma autorização de curto
prazo da ordem de US$ 400 bilhões e outra de US$
500 bilhões até fevereiro de 2012. Até 01 de outubro,
devem estar especificados cortes de US$ 917 bilhões
para um prazo de 10 anos, a contar já, de imediato, em
2012. E, até o final de 2011, o Congresso deve
aprovar um plano adicional com um corte de
despesa/aumento de impostos da ordem de US$ 1,2 a
US$ 1,5 trilhão, também a ser aplicado em 10 anos, a
iniciar em 2013. Um novo aumento do limite da
dívida fica condicionado a esse acordo orçamentário.
Como pode ser visto, resolveu-se o problema
de 2011, mas criam-se outros dois. O primeiro é que,
para ter direito a mais um aumento do limite, com o
agravante de ser ano eleitoral, o Governo terá que
fazer cortes de despesas, gerando novo desgaste
político. E, com isso, atingindo o segundo problema,
que é o fato da economia americana não contar com a
política fiscal para continuar com os estímulos para
sair da crise. A partir de então, todos os olhos se
voltaram para o desempenho da economia e que, na
verdade, não vão nada bem. Os dados de mercado de
trabalho sinalizam a dificuldade em gerar vagas,
mantendo a taxa de desemprego elevada e, os dados
de atividade, em especial os gastos dos consumidores,
sinalizam a fraqueza de quase 70% do PIB em
contribuir para que se saia desse cenário.
De mãos e pés amarrados com a política fiscal
e monetária (os juros já estão baixos), resta torcer para
que a economia americana use sua capacidade de
crescer com produtividade. Ah, e ainda tem a Europa.

Publicado no Informe Econômico 08/agosto/2011

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