terça-feira, 29 de julho de 2014

TUDO QUE SOBE, DESCE....SERÁ?

      A conjugação de crescimento econômico internacional acentuado e estável, nos últimos cinco anos, coloca em perspectiva um cenário comparável apenas ao verificado no pós-segunda guerra mundial. Mesmo diante das recentes turbulências nos mercados de crédito imobiliário nos EUA, de um nível do preço do petróleo em patamares historicamente elevados e das constantes tensões políticas no Oriente Médio, a economia mundial não apresenta sinais de arrefecimento, e as perspectivas são de manutenção dos atuais níveis de crescimento. Afinal de contas, que elementos e fatores estão permitindo esse cenário? Ao final da década de 1950, em momentos de paz, a reconstrução de diversos países na Europa, a maior confiança dos consumidores americanos e a explosão da produção de bens de consumo duráveis, em especial nos EUA, dentre outros fatores, foram essenciais para a consolidação de um cenário de crescimento que durou quase dez anos. Apesar dessa aparente similaridade de performance, o ciclo atual apresenta particularidades interessantes que o diferenciam de todos os demais.

       Na década de 1960, o crescimento americano era acompanhado apenas por uma dezena de países, como os tigres asiáticos e, em certa medida, alguns coadjuvantes na América Latina. Atualmente, o ciclo de expansão tem a contribuição de diversos países em todos os continentes, e os mais importantes personagens nesse processo são a China e a Índia. Hoje, a contribuição da América Latina é maior, há ainda diversos países Africanos e também o Leste Europeu. Podemos afirmar que praticamente todos os países estão se beneficiando, em certa medida, do atual ciclo. Vale destacar que em 2006, os países emergentes representaram cerca de 40% do PIB mundial e 2/3 do crescimento verificado. Além disso, foram responsáveis por cerca de 1/3 de todo o comércio mundial. Portanto, não apenas a maior participação de países no atual ciclo de crescimento mundial representa um fator de diferenciação com o passado, mas também, o fato de que o conjunto dos emergentes revela maiores contribuições.
       O ponto importante a destacar é que o processo de integração comercial e financeira se intensificou nas últimas décadas, aumentando a interdependência entre os países e contribuindo para tornar mais estável a produção. Da mesma forma que o aumento das relações comerciais permite ganhos de escala e eficiência para as empresas, a integração financeira possibilita a diversificação de riscos e a convergência de taxas de juros entre as economias. Em nenhum momento da história mundial ocorreu tanto fluxo de capitais entre países desenvolvidos, entre os últimos e os emergentes e entre os próprios emergentes.
       Diversos estudos, ver IMF(2007), também apontam que os governos dos países desenvolvidos estão implementando uma política monetária e fiscal mais neutra, o que tem sido útil para estabilizar a balança entre crescimento e inflação. Ou seja, as reações de política monetária a momentos de choques, como o ocorrido recentemente no mercado de crédito americano, se diferenciam das respostas de trinta anos atrás. Além disso, os canais de transmissão dessas políticas estão mais limpos e eficientes, resultado do avanço nas comunicações e na integração financeira. Porque não dizer que as instituições tornaram-se mais transparentes e confiáveis, contribuindo para a redução das incertezas dos investidores e consumidores. Hoje é possível acessar dados de receita e despesas de governos com uma defasagem de tempo mínima, avaliar mais de uma centena de indicadores econômicos e antecipar possíveis problemas e, acima de tudo, ter certeza de que as regras serão cumpridas. Porém, esse ainda é um desafio a ser superado pelos governos de diversos países emergentes, que ainda se encontram às voltas com problemas institucionais, menor transparência nos dados públicos e regras pouco críveis.
       A história econômica nos mostra que os períodos de forte crescimento por vezes foram seguidos de momentos de ajuste nos países. Uma característica que parece intrínseca ao sistema capitalista. Porém, como pode ser visto, a teoria econômica evoluiu na sugestão de soluções para essas questões e, ao longo dos últimos anos, os países foram moldando as suas políticas fiscais e monetárias, além de permitirem o surgimento de instituições mais confiáveis e sólidas, de tal forma a reduzir os custos desses ajustes. Similarmente, a inserção mundial em uma maior integração econômica, seja pela via comercial ou financeira, contribuiu para reduzir as excessivas oscilações na produção. Apesar da aparente calmaria, os desafios que se colocam para as autoridades internacionais nesse processo, vão desde a manutenção da neutralidade das políticas monetária e fiscal sobre a produção, até a melhora no controle dos mercados de crédito, passando pela continuação da integração comercial e financeira. E os países emergentes possuem grande responsabilidade nesse ajuste, na exata medida em que passaram a desempenhar papel de destaque no cenário mundial. Apesar do bom relacionamento entre crescimento econômico e estabilidade, devemos nos lembrar que os movimentos cíclicos da economia ainda existem.

 IMF – The Changing Dynamics of the Global Business Cycle, WEO, October, 2007.


Publicado no Informe Econômico/FIERGS 29/10/2007

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