O rápido
crescimento econômico da China nas duas últimas décadas levou pesquisadores e
analistas internacionais a uma corrida em direção a um banco de dados que
pudesse explicar esse fenômeno e, com isso, elaborar diagnósticos e previsões
que norteassem decisões de investimento. Nesse período, o governo Chinês conseguiu
melhorar substancialmente as informações referentes ao desempenho do país,
tanto no que diz respeito à segmentação setorial e regional, quanto ao acesso
dessas por parte do público. Mas, é importante destacar que ainda existem
falhas relacionadas tanto ao “timming”
das divulgações quanto a consolidação de bancos de dados confiáveis.
No primeiro
caso, muitas informações que deveriam possuir periodicidade mensal, e
divulgadas com uma defasagem máxima de 60 dias, ainda são trimestrais ou
semestrais, e não estão disponíveis na mesma velocidade que é feita em outras
economias. No que diz respeito à confiabilidade dos dados, há diversas
variáveis macroeconômicas que apresentam deficiências, como é o caso do
investimento.
Ressalta-se que
essa tem sido a variável mais importante no processo de crescimento econômico
do país nos últimos anos, a ponto de diversos relatórios destacarem os
potenciais riscos que o elevado nível de investimento no país poderia trazer
para o equilíbrio econômico mundial.
Várias publicações
apontam o investimento na China situa-se em torno de 45% do PIB, e que cresce a
uma taxa de 20 a 30% ao ano. Nada mal para um país que necessita criar as
condições para que 800 milhões de pessoas possam participar das vantagens do
mercado. Porém, essa é uma taxa de investimento muito elevada, mesmo para os
padrões da China, e que pode resultar em um desequilíbrio futuro na oferta e
demanda. Além disso, o excessivo investimento pode reduzir de forma substancial
a taxa de retorno do capital no país, deprimindo ainda mais o lucro das
empresas e as intenções de novos investimentos. Relatórios internacionais
destacam que tal resultado poderia desencadear uma seqüência de eventos
negativos sobre a economia mundial com potencial de arrastar inclusive as economias
desenvolvidas.
Entretanto,
observa-se algumas inconsistências estatísticas que podem invalidar esse
diagnóstico. Se esses números fossem reais, somente o investimento seria
responsável por um crescimento do PIB real na China de 9 a 13% ao ano. Acontece
que, além do investimento, outras variáveis também compõem o PIB, como o
consumo privado, o consumo do governo e o saldo da balança comercial. Como se
sabe, a China tem crescido a uma taxa de 9% ao ano. Considerando os números de
investimento como certos, então deveríamos concluir que o consumo das famílias,
o consumo do governo e a balança comercial deveriam apresentar resultados
nulos. Essa não parece ser a realidade atual, tendo em vista o rápido
crescimento do mercado interno via consolidação de uma classe média, o elevado
gasto do governo, em especial no setor de infra-estrutura e também o superávit
comercial que o país tem com o resto do mundo, observado nos últimos anos.
Outro indício
de problema estatístico pode ser evidenciado quando se faz uso de uma
importante identidade econômica, que diz que a poupança interna deve ser igual
ao investimento na economia mais o total de poupança externa utilizado. Sendo
assim, dado que a poupança externa na China é da ordem de 7% do PIB, somando
esse valor à participação do investimento divulgada pelo governo (45%), então a
poupança interna deveria ser de mais de 50%. Porém, todos os estudos feitos
sobre a economia da China apontam um nível de poupança, no máximo, da ordem de
40%. Novamente, nota-se que há uma super-estimação da taxa de investimento do
país. De acordo com analistas, que recalcularam essa taxa, o melhor a se
considerar é que o investimento tenha uma participação de 36% do PIB (no Brasil
está em 20%).
Outro grande
problema apontado tem sido o cálculo da taxa de inflação. Apesar da elevação do
preço das commodities que se observou
no mundo nos últimos anos, o índice de preços na China cresceu apenas 2,2% em
2003 e somente 1% no primeiro semestre de 2006. Destaca-se que esses índices
baixos de inflação contribuem para potencializar os efeitos da taxa real de
investimento, que desconta os efeitos inflacionários.
Apesar da
evidente falha estatística nos dados da China, que prejudica uma análise
técnica mais detalhada, a boa notícia é que, fazendo as correções necessárias,
então parece que o país ainda tem espaço para continuar a crescer calcado em
uma elevada taxa de investimento. E isso deve ocorrer nos próximos anos, em
grande medida, em função do crescimento da demanda por urbanização. Com uma parcela
ainda grande de pessoas migrando do campo para as cidades, haverá a necessidade
de novos investimentos em projetos relacionados ao setor habitacional e também
de infra-estrutura, como energia, rede de água e esgoto.
Como pode ser visto, apesar
das estatísticas apontarem que o país figura em uma zona perigosa de elevado
investimento, o mais correto é afirmar que ainda existe potencial para que a
China continue a crescer nos próximos anos, mantendo ou até ampliando o nível
de investimento.
Publicado no Informe Econômico/FIERGS
20/11/2006
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