domingo, 27 de julho de 2014

A CHINA AINDA NÃO COMEÇOU A INCOMODAR

Em março desse ano foi aprovado na China o 11th FYP (Five Year Plan), que traça as diretrizes de investimentos e ações políticas do governo para os próximos cinco anos (2006-2010). O foco desse último projeto é a redução das desigualdades no país, que se acentuaram na última década com o crescimento assimétrico entre as diferentes regiões, seja quando se compara a parte litorânea com a central, ou norte com sul. Como se sabe, a região litorânea da China é a que apresenta a maior concentração de empresas, capital humano e renda per capita, relegando ao centro do país e às regiões mais remotas a uma situação econômica mais precária. Além de procurar reduzir essas desigualdades, a orientação de crescimento no país será feita no sentido de expandir o mercado interno e com uma política social mais populista, em especial para o segmento da população rural e o migrante. O desafio será grande, pois é necessário equacionar a entrada de cerca de 800 milhões de pessoas nesse mercado sem que tal processo resulte em uma perda de bem-estar para o restante da população, inche os centros urbanos e gere desequilíbrios macroeconômicos.
Enquanto a década de 1980 pode ser apontada como a “era de Shenzhen”, nome de uma cidade localizada na  província de Ghangdong, ao sul do país e a primeira zona econômica especial da China, a década de 1990 foi a “era de Shanghai”, conhecida como a maior cidade do país e o terceiro maior centro financeiro do mundo, atrás apenas de Nova York e Londres. Agora, a nova era para a economia chinesa contempla duas outras províncias, Tianjin e Chongqing, que deverão receber maior atenção do governo central. Para se ter uma idéia dessa nova orientação de política de desenvolvimento, estão previstos gastos da ordem de US$ 43,5 bilhões em renovação industrial na região de Chongqing, província que possui 99 milhões de habitantes e já tem uma economia pujante. Segundo estimativas do governo, em cinco anos o PIB dessa província deverá atingir US$ 174 bilhões, o dobro do valor atual.
Além de priorizar o desenvolvimento dessas duas regiões nos próximos anos, o projeto também traça diretrizes de investimento, em termos nacionais, para o setor de infra-estrutura de transporte rodoviário: construir 38.000 km de rodovia em cinco anos, ao custo total estimado de US$ 12,5 bilhões. Considerando que sejam utilizados os sete dias da semana para trabalho durante esse período, então pode-se esperar que, a cada dia, surja no país 20 quilômetros de novas rodovia pavimentada.
Como salientado anteriormente, o país tem uma grande desigualdade de renda e de oportunidades entre as regiões, e o governo Chinês entende que, aumentar os recursos de investimento em estradas é uma estratégia importante para minimizar essas deficiências. E ele está certo. Diversos programas que foram avaliados pelo ADB (Asian Development Bank), importante agente financiador de projetos na região e que já aportou US$ 6,4 bilhões em construção de estradas na China de 1991 até hoje, totalizando 4,4 mil quilômetros.
Estudos atestam que a infra-estrutura rodoviária tem contribuído para reduzir a pobreza no país nos últimos anos não apenas por permitir de forma direta a melhoria da camada mais pobre da população, que passa a ter acesso a diversos outros bens disponíveis no mercado, mas também por diversificar suas fontes de renda, além de contribuir para a melhora da produtividade das pequenas empresas locais e dos produtores rurais.
O primeiro sinal dessa ação pode ser visualizado em um projeto enviado no mês de junho último pelo governo Chinês ao ADB, e que propõe a construção de 428 km de estradas na província de Heilongjiang, localizada no nordeste do país e que faz divisa com a Rússia. Destaca-se que tal região foi escolhida devido a sua importante localização geográfica e o fato de já possuir uma infra-estrutura de produção instalada, com destaque para os segmentos de petróleo, carvão, metalurgia, aço e na produção de máquinas e equipamentos.  Na verdade, a província de Heilongjiang era uma base industrial do país nos anos 1980 mas, com os baixos investimentos realizados pelo governo local e nacional em diversos ramos, em especial em infra-estrutura, a província foi perdendo importância econômica relativa. Agora, a região deverá se beneficiar da redução dos custos de logística, o que deverá contribuir para aumentar a competitividade das empresas exportadoras ali instaladas (a província tem uma área 1,8 vezes maior que o RS, população de 37 milhões de habitantes, PIB de US$ 53 bilhões e exporta cerca de US$ 4 bilhões por ano).
Como pode ser visto, nesse 11th FYP, os responsáveis pelas diretrizes do crescimento e desenvolvimento do país, cientes da necessidade de devolver a competitividade das indústrias ali localizadas, em especial diante de uma redução dos custos de logísticas, incluíram diversos projetos relacionados a investimentos em infra-estrutura. O projeto do governo Chinês pode parecer ambicioso, mas representa o anseio dos políticos de elevar o país à posição de maior potência econômica no mundo em um espaço de 30 anos. E, para isso, sabem que é necessário planejamento, disciplina e, acima de tudo, comprometimento.


Publicado no Informe Econômico/FIERGS 14/08/2006

Nenhum comentário:

Postar um comentário